31 outubro, 2010

Colectânea de Textos no jornal «i» - XX


As múltiplas sementes dos Ornatos
Publicado em 26 de Novembro de 2009

Há dez anos foi editado o segundo e último álbum de uma das melhores e mais originais bandas portuguesas de sempre, os Ornatos Violeta. Chamava-se "O Monstro Precisa de Amigos" e sucedia ao disco de estreia, "Cão!" (1997). Um terceiro álbum - "Monte Elvis" ou "Rói, Rói, Galinha Roy" - esteve em pré-produção mas nunca viu a luz do dia, devido a divergências que levaram à implosão do grupo em 2002. A notícia do fim dos Ornatos foi recebida com imensa tristeza pelos seus fãs, um grupo extenso que ainda hoje se mantém activo - através de um fórum no site de Manel Cruz - e que justifica plenamente, entre outras coisas, a actual rodagem de um documentário dedicado à banda, "Monstruário", realizado por Gonçalo Castro. Mas o que os seus fãs não sabiam, não poderiam saber, era que alguns dos membros dos Ornatos Violeta viriam a ter carreiras a solo com música tão boa ou melhor que a dos Ornatos. E se alguns deles - Elísio Donas (ex-Per7ume e Homem Musculoso), Peixe (ex-Pluto, agora Zelig) e Kinorm (ex-Homem Musculoso, agora Plus Ultra) - têm tido carreiras algo discretas, já Manel Cruz (ex-Pluto e Supernada; agora Foge Foge Bandido) e Nuno Prata - cujo segundo álbum a solo, "Deve Haver", está prestes a ser editado - têm mantido bem viva a herança dos Ornatos Violeta. A herança transcende os próprios músicos da banda e é uma influência fundamental em grupos novos, exteriores, como os Virgem Suta, Diabo na Cruz, doismileoito, Oioai ou Suite Zero.




Lula Pena - É urgente um disco novo!
Publicado em 03 de Dezembro de 2009

Há mistérios assim. Lula Pena já não é propriamente um segredo absoluto para muita gente - nos últimos anos, em Lisboa, actuou pelo menos na ZDB (a solo e com Norberto Lobo), no Maxime, no Castelo de S. Jorge (com Richard Galliano) e neste último fim- -de-semana, no Lisboa Mistura (S. Luiz), acompanhada pelos Tigrala - mas não há meio de sair um novo álbum que suceda ao pioneiro "Phados", editado em 1998, já lá vão onze anos. Conta a lenda que um segundo disco, "Profissão de Fé", esteve quase a ser lançado, mas que vicissitudes várias impediram que tal acontecesse. E vê-la agora em palco com os Tigrala - os guitarristas Norberto Lobo e Guilherme Canhão e o percussionista mexicano Ian Carlo Mendoza -, que são os cúmplices perfeitos para a sua música cada vez mais elaborada, ainda aumenta mais a vontade, a necessidade, de um álbum novo. Esclareça-se: uma elaboração que nunca é sinónimo de música complexa ou difícil, mas da crescente inteligência com que Lula mistura, num mesmo tema, encontrando-lhe os elos perdidos, fados e mornas, música tradicional portuguesa e muitas outras músicas, tradicionais ou modernas. Ouvir a "Senhora do Almortão", da Beira Baixa, cantada em sussurro por Lula, com a sua guitarra a soar cada vez melhor e mais presente, ao lado de Lobo no bouzouki, Canhão na outra guitarra e Mendoza no vibrafone, foi dos momentos musicais mais arrepiantes que presenciei nos últimos anos. Gostava tanto de a (re)ouvir em disco!



Indie-rock muito mais indie do que rock
Publicado em 10 de Dezembro de 2009

Nesta coluna já se glorificaram bastantes nomes de vários géneros musicais extra-rock e alguns dos vários rocks que hoje se fazem em Portugal. Hoje fala-se aqui de quatro novos projectos que estão no rock - seja lá isso o que ainda for -, mas que se servem dele apenas como trampolim para uma música única, original, indie no sentido de independente (de rótulos e de rocks). Noiserv (na foto) é o projecto pessoal de David Santos -- Kids on Holidays; You Can't Win, Charlie Brown --, onde canta e toca todos os instrumentos, incluindo caixinhas-de-música e instrumentos de brincar, à maneira de Pascal Comelade. Outras referências possíveis são Sufjan Stevens, The The ou Beirut, mas isto não chega para descrever as canções únicas de Noiserv. Igualmente originais, mas numa linha mais experimental, os portuenses :papercutz (aka Bruno Miguel) dissecam e intersectam as electrónicas com instrumentos acústicos e a excelente voz de Marcela Freitas - a influência de Ryuichi Sakamoto ("Forbidden Colours") é aqui mais uma bênção. Abençoada é também a música de Tiago Sousa, pianista que podia bem fazer carreira na música erudita ou no jazz mas que opta por levar ambas as linguagens para um território híbrido, minimal e aventureiro. Minta & The Brook Trout é o novo projecto de Francisca Cortesão (ex-Casino), que nesta nova etapa - ao lado de Manuel Dórdio, Mariana Ricardo e José Vilão - mostra como um pop juvenil se pode transformar em música absolutamente maravilhosa feita de canções luminosas e sublimes.

3 comentários:

non ou disse...

Eu já tenha lido um (esse) texto sobre os ex-Ornatos e penso que tinha algumas pequenas correcções tipo Homem Musculoso. Penso que não estou errado.

António Pires disse...

Obrigado! Às vezes a net prega-nos partidas! Vou já corrigir Homem Moscovo por Homem Musculoso! Abraço,

António

António Pires disse...
Este comentário foi removido pelo autor.