09 setembro, 2008

Rokia Traoré, Toumani Diabaté e Richard Bona - África Cada Vez Mais Global


Em tempo de regresso às lides, aqui ficam hoje três textos publicados originalmente na revista «Time Out Lisboa» há alguns meses, sobre os discos mais recentes de três nomes incontornáveis da música africana: Rokia Traoré (na foto), Richard Bona e Toumani Diabaté. E todos eles passaram por cá também durante o Verão para concertos em festivais ou em espectáculos em nome próprio.


TOUMANI DIABATÉ
«THE MANDÉ VARIATIONS»
World Connection/Megamúsica

Ouvir a música de Toumani Diabaté - assim, em estado puro, só os seus dedos a percorrerem a kora (a harpa dos países da região mandinga) - é como escutar o som da água de um rio que corre (e esse rio tanto pode ser o Niger como o Mississippi como o Tejo, pelas sonoridades que cada um deles imediatamente congrega, ou até um rio algures no Extremo Oriente - oiça-se o primeiro tema, «Si Naani»). Um rio de caudal largo mas em que cada gota, cada som, cada nota, que sai dos dedos mágicos de Toumani tem o mesmo valor de outra (sua) gota qualquer. Cúmplice de músicos tão diferentes quanto Ali Farka Touré (ao qual é dedicado um dos temas de «The Mandé Variations») ou Bjork, os Ketama ou Taj Mahal, Toumani Diabaté mostra-se neste disco - e sem a companhia da sua Symmetric Orchestra - em toda a sua essência e mostra aquilo que é desde há muito tempo: o maior intérprete de kora do mundo e um músico e compositor extraordinário. Uma obra-prima. (******)


ROKIA TRAORÉ
«TCHAMANTCHÉ»
Universal Music France

Apenas dez anos de carreira musical foram suficientes para que Rokia Traoré se estabelecesse como um dos nomes maiores da música africana actual e uma cantautora com uma voz própria e pessoalíssima. Requisitada para colaborações com gente tão diferente quanto o Kronos Quartet, com quem se apresentou em Lisboa a semana passada e que também participou no seu álbum «Bowmboi», ou grupo de hip-hop senegalês Daara J, Rokia atinge no seu novo álbum «Tchamantché» um patamar de excelência difícil de igualar por muitos dos seus pares. Equilibrando muitíssimo bem - «Tchamantché» quer dizer exactamente «equilíbrio» em língua bambara - a música de inspiração pan-africana com muitas outras músicas, dos blues e do jazz ao rock e ao hip-hop (oiça-se a «human beat box» em «Zen»), e instrumentos tradicionais africanos como o n'goni e as percussões com instrumentos exteriores como a guitarra eléctrica Gretsch - que ela própria toca - ou a harpa. E o resultado é um disco variadíssimo, cantado em bambara, francês (a canção «Zen» poderia fazer parte do reportório de Camille) e inglês (o standard de jazz «The Man I Love», numa versão maravilhosa), em que África está sempre presente – canções como «Dounia», a fabulosa «Kounandi» (diálogo de voz, n'goni, guitarra eléctrica e uma harpa a fazer de kora) a mais festiva «Koronoko» ou a politicamente interventiva «Tounka» só poderiam sair da pena de uma africana -, mas filtrada pelo génio de uma compositora que já viu muito mundo e já ouviu muita música. E que, sem complexos nem barreiras nem fronteiras, faz do mundo casa sua e de muita música a sua música. (*****)



RICHARD BONA
«BONA MAKES YOU SWEAT - LIVE»
Emarcy/Universal Music


Assim como a música africana influenciou decisivamente o jazz e os blues, e a partir daí, toda a música moderna anglo-saxónica, também muitos e respeitados músicos africanos foram ao "ocidente" buscar boa parte da sua inspiração musical: Fela Kuti foi a James Brown; Ali Farka Touré a John Lee Hooker; Abdullah Ibrahim (aka Dollar Brand) a Thelonious Monk. E Richard Bona vai a... Jaco Pastorius. Mas, um «mas» enorme!, o camaronês Bona é um baixista fabuloso que não precisa de referências para se impor; é um cantor maravilhoso; e é um amante de música que consegue neste álbum - gravado ao vivo na Hungria, em 2007 - mostrar bem as suas raízes africanas, em ritmos e melodias (oiça-se a balada «Kivu & Suninga»), e muitas outras paixões: da salsa a Stevie Wonder, de Joe Zawinul a John Legend... (*****)

2 comentários:

Anónimo disse...

Óptima crítica ao disco do Toumani Diabaté. E uma obra-prima, sem dúvida. Os outros dois vou investigar. Um abraço.

António Pires disse...

Rui G:

O disco do Toumani é uma maravilha, mesmo!! E, dos outros dois, apesar de pessoalmente gostar mais do da Rokia, o do Richard Bona também é muitíssimo bom!!

Um grande abraço...