30 abril, 2007

O Intercéltico do Porto Está Vivinho da Costa!



O recuperado Cinema Batalha (vénia aos empregados, desde os do restaurante às do bar e aos porteiros da cave-discoteca, inexcedíveis em simpatia e profissionalismo) foi um excelente cenário para o Intercéltico do Porto, desta vez com a vantagem - sempre reclamada e só agora, felizmente, satisfeita - de ter uma plateia de pé onde se podia dançar e, diga-se, onde a dança nunca faltou. E, refira-se, um Batalha cheio no primeiro dia e quase cheio (havia Boavista-FC Porto nessa noite) no segundo. Nem tudo foi perfeito - Quico, atrás dos botões da mesa de som, queixava-se da reverberação da sala, com paredes ecoantes vivas e muito altas - mas o balanço foi mais que positivo. Na primeira noite actuaram os Lúmen (agora com Cristina Castro a ocupar, e muito bem, o lugar de vocalista), que puseram logo dezenas de pessoas a dançar ao som da sua música híbrida que tanto pode fazer uma abordagem punk da «Saia da Carolina» como pode mergulhar no flamenco ou cruzar o ska com a música «celta». Depois, os irlandeses Téada (diz-se «Têida», o que provocou algumas piadas óbvias entre o círculo de amigos que por lá se formou) mostraram como a maestria no domínio dos instrumentos (com destaque para o violonista Oisín Mac Diarmada) e o apego às raízes, neste caso à música maioritariamente originária de Sligo e também do cancioneiro dos emigrantes irlandeses nos Estados Unidos, pode também ser sinónimo de renovação e emoção e evolução. Depois, num espaço paralelo, os Bailebúrdia (e outros músicos que se quiseram a eles juntar) recuperaram muito bem o velho espírito do Intercéltico, com danças e despiques (chegou a haver cinco gaiteiros, ou mais?, a meter o «Smoke On The Water», dos Deep Purple, pelo meio de temas tradicionais). A noite, já longa, ainda teve uma extensão, como não podia deixar de ser, no Contagiarte. Na segunda noite, a surpresa foi os... Mu (na foto; de Nelson Silva). E surpresa porque, em poucos meses, o grupo cresceu imenso em maturidade, criatividade, coesão, alegria. Os Mu - que já antes faziam uma festa pegada ancorada nas danças tradicionais europeias - continuam nessa linha mas agora, agora que estão prestes a editar o seu segundo álbum e foi neste novo reportório que o concerto se baseou, com alguns acrescentos importantes em termos de formação: do grupo faz agora também parte Sérgio Calisto (violoncelo, moraharpa, bouzouki), que veio dar uma maior consistência ao grupo, e neste concerto tiveram como convidada em três temas a cantora Helena Madeira (ex-Dazkarieh, agora no Projecto Iara), cuja voz entrou que nem uma luva na música dos Mu. Semi-desilusão foram os galegos Pepe Vaamonde Grupo. Tal como os Téada, todos os músicos do PVG - liderados pelo gaiteiro... Pepe Vaamonde - são um portento de técnica, de precisão e da arte de bem recuperar a, neste caso, tradição musical galega. Mas, sabe-se lá porquê, no concerto do Intercéltico o grupo teve um défice de emoção que empobreceu a comunicação com o público e a beleza do espectáculo. Nada de grave, principalmente porque a seguir houve outra dose de Bailebúrdia, desta vez no hall do Batalha e com ainda mais gente a participar nas danças. O fim de noite, esse, ficou reservado para a surrealista incursão na delegação do Sporting no Porto feita por três benfiquistas (eu, o Luís Rei e o Pedro), onde encontrámos música feita por clones bastante credíveis dos Ramones e de Jimi Hendrix enquanto bebíamos as últimas cervejas e picávamos petiscos inesperados como fígado de cebolada e febras com morcela (tudo bastante picante!) preparados por uma senhora cabo-verdiana e... benfiquista. Só faltou a cachupa. Nota final 1: foi bom rever o Avelino Tavares, o mesmo anfitrião de sempre, de excelente saúde e com vontade de mais Intercélticos do Porto (venham eles!). Nota 2: está agora a sair um álbum, editado pela Som Livre, comemorativo dos vinte anos do festival em que estão canções de alguns dos artistas e grupos emblemáticos que já passaram por lá: Fairport Convention, Luar na Lubre, Júlio Pereira, Maddy Prior, Sétima Legião, Tri Yann, Kepa Junkera, Vai de Roda, Gaiteiros de Lisboa, Uxia, Kila, Brigada Victor Jara, Ghalia Benali & Timnaa, Carlos Nuñez, Galandum Galundaina, entre outros. Faltam muitos (mais de 80 projectos já estiveram no Festival), mas a amostra presente no disco é suficiente para se perceber o que o Intercéltico do Porto já fez pela divulgação de muitas, muitas músicas - e não só a, novamente entre aspas, «celta».

27 abril, 2007

Intercéltico do Porto - Começa Já Hoje!



Já tinha muitas saudades do Intercéltico do Porto. E não há melhor maneira de as matar, às saudades, que ir até lá e mergulhar de cabeça no calor e amizade que aquele Festival sempre nos dá. Vou com amigos, à espera de reencontrar amigos. E isso é bom... O programa do Festival - que decorre no Cinema Batalha - é, como já foi referido neste blog há dois meses, constituído por concertos dos Lúmen (Portugal) e Téada (Irlanda), hoje, dia 27; e dos Mu (Portugal) e Pepe Vaamonde Grupo (Galiza; na foto), amanhã, dia 28. Mas há uma novidade: depois dos concertos há bailes com música tradicional europeia pelos Bailebúrdia (grupo que integra alguns elementos dos Mu), no denominado Folk Club (café-concerto) do Cinema Batalha. Como extensão do Festival Intercéltico, a cidade minhota de Arcos de Valdevez acolhe hoje um concerto da Brigada Victor Jara e, amanhã, dos Téada, na Casa das Artes. E, para acompanhar o Festival, foi criado um blog que se pode encontrar aqui. Até domingo...

26 abril, 2007

1 Giant Leap - Segundo Álbum Ainda Este Ano


Incansáveis garimpeiros das músicas, cores, pensamentos e diferenças e semelhanças deste mundo, os 1 Giant Leap estão em fase de conclusão do seu segundo álbum e DVD, estando prevista a sua edição conjunta para antes do final deste ano. Este segundo projecto do duo de Jamie Catto e Duncan Bridgeman - dois músicos fortemente influenciados pelos trabalhos pioneiros na pesquisa da chamada «world music» de Peter Gabriel e David Byrne/Brian Eno e que no seu primeiro álbum procuravam a «unidade na diversidade» - tem desta vez como balizas conceitos mais polémicos como «Sombra, Vergonha, Dor, Raiva, Nós e Eles, Conflito» mas também «Liberdade, Sexo, Amor», tendo para isso recolhido música, sons, imagens e ideias na China, Japão, Brasil, México, Médio Oriente e nove países africanos. Entre os músicos, cantores, actores e escritores presentes neste segundo álbum estarão alguns dos colaboradores que já tinham entrado no primeiro projecto e, ainda, Noam Chomsky, Tim Robbins, KD Lang, Zap Mama, Susan Sarandon, Courtney Love, Daniel Lanois, Alanis Morissette, Oumou Sangaré, Rokia Traoré, Lila Downs, Deepak Chopra, Stephen Fry, Douglas Coupland e John Cusack. O primeiro álbum/DVD dos Giant Leap, homónimo, foi editado em 2002, também gravado em variadíssimos países - Senegal, Gana, África do Sul, Uganda, Índia, Tailândia, Austrália, Nova Zelândia, Estados Unidos, Inglaterra... - e nele colaboraram, entre outros, o recém-falecido Kurt Vonnegut, Michael Stipe, Tom Robbins, Dennis Hopper, Brian Eno, Asha Bhosle, Baaba Maal, Ulali, Maxi Jazz, Mahotella Queens, Speech, Neneh Cherry, Michael Franti, Grant Lee Phillips e Horace Andy.

25 abril, 2007

E Se... (ou O Monólogo do Censor Neste Dia de 2007)



(O Censor, vestido casualmente, entra, senta-se e liga o computador onde os seus funcionários gravaram, digamos, previamente, os ficheiros a analisar durante o longo dia de trabalho que o espera... Pormenor importante: o rato do computador é azul. Fora de cena está, presumivelmente, uma outra personagem que nunca aparece)


- Mas o que é isto? Estes Gaiteiros de Lisboa estão a gozar com o nosso folclore; só pode! Proibido.

- Uxu Kalhus? A mesma coisa (e onde é que eles foram aprender a escrever, hem?, nem devem ter a quarta classe, o que, pensando bem, nem é lá muito má ideia). Proibido.

- Uiiiiiiiiiiiiiiiii... Estes Moonspell tocam mas é coisas do Diabo... Proibido.

- E os Roncos do Diabo... Roncos do Diabo? Pois, estava-se mesmo a ver. Proibido.

- A Ruth Marlene mostra demasiado as pernas - eh, pá, são boas, mas é para arquivar - arquiva aí na letra G - é de quê?, perguntas tu, é de gajedo, porra! Proibido.

- Os GNR porque se chamam GNR (ah, e, se bem me lembro, também já fizeram pouco da Nossa Senhora). Proibido.

- O que é que a rapariga d'A Naifa, bem gira por sinal, está para aqui a cantar?... Ela está mesmo a dizer «Foder»? Proibido (mas arquiva aí a foto dela).

- E este Pedro Abrunhosa agora vem com esta dos sem-abrigo. Mas quais sem-abrigo, porra? Em Lisboa não há nenhum sem-abrigo. O quê, o gajo é do Porto? Mas no Porto também não há, porra. Huuum, e ele também já cantou algo com a palavra «foder», huuuuum, mas é homem, não é?, e isso torna o caso diferente... huuum, ou não?, deixa cá ver... Proibido.

- E como é que se chamam mesmo estes gajos? Orgasmo?... Proibido.

- Este DJ Vibe passa música que incita ao consumo de drogas. Proibido.

- The Vicious 5? Drogas. Proibido.

- Xutos & Pontapés? Mais drogas (ah, pois, e as letras). Proibido.

- Os Madredeus invocam o Santo Nome de Deus em vão. Proibido.

- Uma mulata moçambicana a cantar fado?!?... Como é que ela se chama mesmo, Mariza? Ná! Ná!! Proibido.

- O Sérgio Godinho e o José Mário Branco, deixem-nos lá estar porque lá em França é que estão bem. Proibidos, sempre.

- Linda Martini? Martini? Eh lá!!!! Então e a promoção do Vinho do Porto e do Vinho da Madeira? Proibido.

- O quê? E também há uns Smartini? Porra, que obsessão! E o nosso tintol, hem? Proibido.

- O Legendary Tiger Man mostra gajas nuas nas capas dos discos e usa calças demasiado apertadas. Arquiva aí as capas na letra que já te disse. Proibido.

- Brigada Victor Jara? Victor Jara?, eh lá, comunas!!! Proibido.

- Cindy Cat? Cindy Cat?, eh lá, comunas!!! Proibido.

- E que porra é esta de andarem a gravar canções do Zeca Afonso? Quantos são, afinal? Vejo aqui: Frei Fado d'El Rei, Erva de Cheiro, Couple Coffee, Cristina Branco, Drumming, Jacinta, Banda Futrica... Já chega, porra! Estás a dizer que ainda há mais?... Proibidos, todos proibidos.

- E em que língua é que cantam mesmo os Blasted Mechanism?... Karkoviano? Língua de Karkov? Isso não existe, pá! Isso é russo, não é? Ah, pode ser polaco? Olha lá, mas não será antes húngaro?... Ou é código?... Que se foda, vi logo que era língua de comunas... Proibido.

- The Great Lesbian Show? The Great Lesbian Show?, eh lá, isto agora pode ser interessante - junta aí à Ruth Marlene e às outras no gajedo; o quê?, há só uma gaja no grupo? Então, então, então... Proibido.

- Mas que barulheira assustadora e incompreensível vem a ser esta dos Caveira? Não têm letras? Sim, eu sei que não têm letras, foda-se! Proibido.

- Ala dos Namorados? Mas estão a gozar com a nossa História ou quê?... Proibido.

- Mão Morta?... Insurreição absoluta. Pop Dell'Arte?... Também... Todos Proibidos.

- Buraka Som Sistema, eh pá, isto lembra-me as festas em Luanda em 2003... Que saudades dos tempos da tropa, pá, até me vêm as lágrimas aos olhos. Mas na Buraca não quero isto, porra! Proibido.

- O quê? Mais pretos? Eh pá, não estou para ouvir estes discos todos, chiça, porra, tantos!!! Eles que vão fazer hip-hop e reggae e essas porras todas p'rá Holanda ou para os Estados Unidos. E que fumem ceruma e que a coca-cola lhes faça bom proveito... Proibido.

- Isto sim, isto agora é que é, um grupo chamado Dr.Salazar! Isto sim! Isto é que é! Respeito!... Mas espera lá, que merda de chinfrineira é esta?... Como é que chamam a esta merda? Rock industrial? Se é industrial, eles que vão mas é trabalhar para a CUF, a Lisnave e a Siderurgia... Eles devem é estar a gozar. Ou não?... Por via das dúvidas, proibido.

A Bem da Nação...


(Nota: a imagem incluída neste post apresenta carimbos usados pela Censura em Portugal durante o Estado Novo e foi encontrada no site Galeria Virtual da Censura. Nota 2: todos os grupos e artistas referidos existem neste momento)

24 abril, 2007

Tinariwen, Victor Gama, Kalaf e Cinema - Também no África Festival



O bolo principal do África Festival, que decorre no relvado junto à Torre de Belém, em Lisboa, já é conhecido mas fica aqui recordado: Mayra Andrade e Músicos do Nilo no dia 28 Junho; Paulo Flores e Bassekou Kouyaté no dia 29; e Sally Nyolo e Baaba Maal no dia 30. Mas o Festival inclui ainda outros concertos de bastante interesse e muito cinema, na sua extensão ao Cinema S.Jorge, também em Lisboa, de 1 a 8 de Julho. Da programação de concertos faz parte o novo projecto do músico, compositor e construtor de instrumentos Victor Gama «FWD: Utopia» (4 de Julho); do fabuloso grupo de tuaregues do malianos Tinariwen, que recentemente editou o álbum «Aman Iman», cuja crítica pode ser encontrada um pouco mais abaixo neste blog (dia 5 de Julho); e de um novo projecto em que Kalaf (na foto) convida músicos angolanos e de outros países, Ecos da Banda (dia 7 de Julho); para além das Kizomba Sessions (um concurso de kizomba que decorre de 3 a 6 de Julho, seguido de um workshop de kizomba por Avelino Chantre, a 7).

Também no S.Jorge é apresentada, nestes dias, uma variadíssima programação de cinema, «Sons e Visões de África», que inclui os filmes «Bamako», de Abderrahmane Sissako (dia 3); «Bajove Dokotela - The Philip Tabane Story», de Khalo Matabane e Dumisani Phakathi, «Being Pavarotti», de Odette Geldenhuys, e «Amandla!», de Lee Hirsch (dia 4); «Le Miel N'Est Jamais Bon Dans Une Seule Bouche - Ali Farka Touré», de Marc Huraux, e «Teshumara - Les Guitares de La Rébellion Touareg», de Jérémie Reichenbach (dia 5); «Ishumars, Les Rockers Oubliés du Désert», de François Bergeron, e «Sierra Leone's Refugee All Stars», de Zach Niles e Banker White (dia 6); «Marrabentando, ou As Histórias Que a Minha Guitarra Canta», de Karen Boswell, «Muxima», de Alfredo Jaar, e «Mãe Ju», de Kiluanje Liberdade e Inês Gonçalves (dia 7); «Calado Não Dá», de João Nicolau, «Mais Alma», de Catarina Alves Costa, «Batuque, A Alma de Um Povo», de Júlio Silvão Tavares, e «Lusofonia, A (R)evolução», da Red Bull Music Academy (dia 8). Também integrado na programação do África Festival está o lançamento do livro «Lisboa na Cidade Negra», de Jean-Yves Loude.

23 abril, 2007

Fausto, Godinho, Afonso, Vitorino, Branco - Barrigada de Boa Música na RTP

É tão raro a RTP - e, já agora, a SIC e a TVI - dar espaço à boa música portuguesa que a programação desta semana da RTP (e logo a 1 e a 2) é motivo para festejar. Ora veja-se: à «boleia» de duas efemérides, os vinte anos da morte de José Afonso e o 25 de Abril, a RTP 2 vai transmitir concertos de José Afonso, Fausto, José Mário Branco, Vitorino (na foto) e Sérgio Godinho. E a RTP 1 vai transmitir dois programas dedicados a José Afonso. E assim, aquilo que não deveria ser notícia - a passagem de concertos e programas dedicados aos grande nomes da nossa música (se fosse isso que acontecesse normalmente) - é, mais do que uma boa notícia, um luxo.

Hoje, segunda-feira, à noite, a RTP 2 transmite o histórico espectáculo «José Afonso ao Vivo no Coliseu» (gravado em Janeiro de 1983, no Coliseu dos Recreios de Lisboa). E no resto da semana, há ainda concertos de José Mário Branco (terça-feira; o concerto de apresentação de «Resistir É Vencer», de 2004, também no Coliseu de Lisboa), Sérgio Godinho (quarta-feira; o concerto «De Volta ao Coliseu», com Camané, Jorge Palma, Vitorino e David Fonseca como convidados), Fausto (quinta-feira; num concerto gravado em 1990) e Vitorino (sexta-feira; concerto gravado no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, em 1993). Sempre nas «Noites da 2». Por sua vez, a RTP 1 transmite, dia 24, o concerto de homenagem a José Afonso recentemente realizado na Galiza - «Sempre Abril» (Gala Homenaxe a Zeca) em que participaram artistas espanhóis, galegos, portugueses e africanos - Luis Pastor, Uxia, Faltriqueira, Antón Reixa, Dulce Pontes, Vitorino, Janita Salomé, Sérgio Godinho, Júlio Pereira, Tito Paris e Manecas Costa, entre muitos outros. E no dia 25 de Abril, às 17h45, passa, também na RTP 1, o documentário «Não Me Obriguem a Vir Para a Rua Gritar/Tributo a Zeca Afonso», em que a «SubFilmes convidou vários artistas de áreas criativas contemporâneas para criarem uma obra de arte especialmente para Zeca Afonso», desafios aceites por músicos de estilos diferentes - Rádio Macau, Nancy Vieira, Couple Coffee, Vicious 5 e Raquel Tavares - e artistas de outras áreas: «a companhia de teatro Primeiros Sintomas, a dupla de videojamming Daltonic Brothers, Target e Mosaik no street art, Quebra-Diskos no turntablism», entre outras colaborações e tertúlias de reflexão à volta da obra de José Afonso.

21 abril, 2007

Kultur Shock, OMFO, Haydamaky, Kerekes Band - Tudo de Novo a Leste



Apesar de, durante os anos de vigência do socialismo nas antigas repúblicas dos países de Leste, por lá terem surgido muitos artistas e grupos musicais, mais ou menos clandestinos, que iam ao rock buscar a sua inspiração - dos húngaros Omega (inesperados estandartes do rock sinfónico) ao cantor russo Boris Grebenshikov ou aos polémicos jugoslavos Laibach, entre muitos outros -, a verdade é que a queda do Muro de Berlim ajudou bastante à proliferação, aos milhares, de projectos musicais de músicos dos países de Leste que têm no rock e derivados (do punk à electrónica e ao funk) a sua inspiração e nas músicas tradicionais a sua âncora ao local de origem. Assim de cabeça, Yat-Kha, DJ Shantel, Emir Kusturica, Warsaw Village Band, Gogol Bordello ou Korai Orom são apenas alguns exemplos que vêm imediatamente à memória. E neste lote que apresento hoje - Kultur Shock, OMFO (na foto), Haydamaky e Kerekes Band - há lugar para muita música diferente mas as raízes, essas, estão lá sempre.


HAYDAMAKY
«UKRAINE CALLING»
Eastblock Music/Indigo

Efeito perverso de como, por vezes, gravar para uma multinacional pode condicionar a difusão da música é o facto de os ucranianos Haydamaky - que têm dois álbuns gravados para a EMI - só terem chegado a mais ouvidos um pouco por todo o lado ao terceiro álbum, este «Ukraine Calling», através de uma independente. Mas, se calhar, isto vai perfeitamente de encontro à música do grupo: uma música que nunca, jamais, poderia ter barreiras de espécie nenhuma. Uma música poderosíssima, electrizante, quase diabólica no modo como consegue unir variadíssimas linguagens «ocidentais» - o rock entendido em sentido lato e mais especificamente o punk, os evangelhos da música jamaicana (ska, reggae, dub, rocksteady) - e a sua música local, ucraniana, com todas as ligações imaginárias ou concretas a músicas vizinhas, da música russa às charangas ciganas balcânicas. Mas o mais espantoso nisto tudo é que os Haydamaky - quase sempre em alta velocidade, só por vezes descendo a uma música mais lenta e encantatória (como na lindíssima e arrepiante «Pid Oblachkom») - conseguem fazer disto tudo e da sua mistura uma música verdadeira, única, orgânica, por vezes violentíssima e... inesquecível. Relembre-se o que os Pogues conseguiram com a sua mistura de punk (e outras músicas) com a folk irlandesa e pode-se, transpondo-se isto para a escala ucraniana, imaginar o que sai daqui. (9/10)


OMFO
«WE ARE THE SHEPHERDS»
Essay Recordings

E que tal uma mistura de electro, disco-sound, dub, experimental - com balizas nos Kraftwerk, nos Air, nos New Order, em Lee «Scratch» Perry, no Senõr Coconut, nos Daft Punk e em Arthur Baker -, tudo ao molho e fé em Lenine e tudo aromatizado com vozes vindas do coração da ex-União Soviética, flautas em delírio, mais secções de metais balcânicas, acordeão fumegante, alusões à música mexicana - «Tequila Gang Bang» (!) -, música de carrinhos-de-choque (olha ali os Fat Freddy a espreitar em «Jok de Doi»), saltérios alucinados, gravações de ovelhas em cio demente?... Sim, isto existe e é, por vezes, muito bom!... E está no segundo álbum do ucraniano OMFO (aka German Popov; aka Our Man From Odessa), «We Are The Shepherds», que sucedeu ao igualmente estranhíssimo «Trans Balkan Express». Popov é um músico da cidade ucraniana de Odessa - eternizada na cena do bébé a cair da escadaria no «Couraçado Potemkin», de Eisenstein - radicado em Amesterdão que, nos últimos anos, tem colaborado com gente tão diferente quanto a cantora de Tuva Sainkho Namtchylak, Metamatics, Felix Kubin (estes últimos colaboradores no seu projecto Solaris), DJ Shantel ou Richard Dorfmeister. O facto de OMFO dizer que este álbum foi inspirado por Gagarin (um pastor), Laika (uma cadela de pastorícia) ou o astronauta norte-americano William... Shepherd é só um pormenor. Divertido. (7/10)


KULTUR SHOCK
«WE CAME TO TAKE YOUR JOBS AWAY»
Koolarrow Records

Ouvir os Kultur Shock tem o mesmo efeito de murro no estômago de ouvir os Gogol Bordello ou os Haydamaky - estamos, portanto, num território mais ou menos conhecido. Mas com algumas diferenças lá dentro: os Haydamaky têm doses reforçadas de punk (vertente hardcore muitas vezes), têm ska, têm tango e música turca, têm alusões à música klezmer, ao jazz e a muito da música cigana húngara, romena e da ex-Jugoslávia... mas têm também um poder sónico vindo directamente do metal: com o thrash-metal e o speed-metal à cabeça (os gajos ouviram muito Metallica e Sepultura, sem dúvida). O que é mais excitante no meio disto tudo é que eles conseguem calibrar sempre, e bem, as doses de géneros musicais diferentes (e até de línguas em que cantam) fazendo delas um território, dir-se-ia, conexo, bastante próximo e naturalmente irmão. Os Kultur Shock são, imagine-se, originários de Seattle, nos Estados Unidos, e são uma misturada completa de músicos de variadíssimas origens: o líder da banda, Gino, um bósnio de Sarajevo (que colaborou com Joan Baez - coisa que, ouvindo-se a música dos Kultur Shock, nunca se imaginaria - e é amigo de Krist Novoselic, que tem ascendência croata e foi o baixista dos, pois, Nirvana), mas também músicos dos Estados Unidos, Japão e Bulgária. «We Came To...» - um manifesto irónico da condição de imigrante nos Estados Unidos - é o quarto álbum do grupo e é, repete-se, um murro violentíssimo no estômago. (8/10)


KEREKES BAND
«PIMASZ»
Hangveto

A música da Hungria tal como a conhecemos - a Hungria da maravilhosa Márta Sebestyén e dos fabulosos Muzsikás; a Hungria dos Zungó, dos Besh-o-Drom, dos Vasmalom ou, num espectro diferente, dos já referidos Korai Orom - tem na Kerekes Band um upgrade inesperado. Porque sempre que os ouvimos, pelo menos neste álbum, «Pimasz» (que tem como sub-título «Magyar Funk»), a música tradicional húngara está lá, bem presente, de raiz, naquelas melodias e principalmente naquela flauta (a flauta de Fehér Zsombor, líder do grupo), naqueles sons antigos que já tínhamos ouvido antes em Márta Sebestyén com ou sem os Muzsikás e nalguns dos outros (vários dos temas da Kerekes Band são comuns a outros dos nomes já mencionados), mas nunca com este envolvimento rock, eléctrico, que tanto remete para os blues psicadélicos de Jimi Hendrix como para o funk ácido de Sly & The Family Stone como para o jazz-rock de Herbie Hancock ou para os Doors ou Bob Dylan ou - ok, há mesmo uma flauta aqui metida, não é? - os Jethro Tull. Mas sempre com uma magia (oiça-se o quarto tema, «Searching») e uma ligação à terra incontestáveis. A Kerekes Band nasceu na cidade de Eger em 1995 e rapidamente se assumiu como uma das mais importantes bandas folk (?) húngaras. Com «Pimasz» arriscam-se a ser uma das mais importantes bandas folk (? e outra vez ?) europeias. (8/10)

20 abril, 2007

Gaitas em Festa no Kilombo de Benfica



Amanhã, dia 21, no Kilombo de Benfica, decorre o II Gaitas em Festa, encontro de escolas e de grupos musicais que têm na gaita-de-foles a sua origem ou inspiração, organizado pela Trupe Boomerang. Às onze da manhã decorre um workshop dirigido por Paulo Marinho (Gaiteiros de Lisboa/Sétima Legião) dedicado à afinação de gaitas-de-foles em conjunto. A partir das 15h00 há demonstrações de escolas de gaitas-de-foles com os Bardoada, Casa Pia de Lisboa, Gil Teatro, Associação Gaita-de-Foles e Xuventude da Galiza. À noite, a partir das 20h00, há concertos pelos Trabucos (música medieval), Anaquiños da Terra (folk galega), Roncos do Diabo (que têm nas gaitas transmontanas as suas «armas» de eleição) e, como justos cabeças-de-cartaz, os incontornáveis Gaiteiros de Lisboa (na foto). Prevê-se uma festa pegada, portanto... O Kilombo - espaço da Trupe Boomerang - fica na Av. Gomes Pereira, nº11, Parque de Estacionamento Villa Simões, Armazém 13. E os bilhetes para o II Gaitas em Festa custam 7 euros.

19 abril, 2007

José Afonso - Outras Homenagens



Dia 24 (ou, segundo outras fontes, dia 25) de Abril, a RTP e a TV Galiza vão transmitir um espectáculo de homenagem a José Afonso (na foto), «Gala Homenaxe a Zeca», que, contam as crónicas - vf. na reportagem do Diário de Notícias - foi um momento de comunhão único entre artistas portugueses, galegos e africanos, irmanados à volta da música e da memória de José Afonso. No concerto, realizado no Paço da Cultura de Pontevedra, participaram, pelo lado espanhol Luis Pastor; pelo lado galego as cantoras Uxia e Mercedes Péon, as pandeireteiras e cantoras Faltriqueira, Trexadura, Narf, duas velhas glórias do rock galego - Víctor Coyote e Antón Reixa (dos Resentidos) - e ainda Benedicto, Miro Casabella e Xico de Cariño; pelo lado português Dulce Pontes, Vitorino, Janita Salomé, Sérgio Godinho, Júlio Pereira, Zeca Medeiros, João Afonso e Cantadores do Redondo; e, pelo lado africano, Tito Paris, Manecas Costa e Jon Luz. O grande ausente da Gala, por motivo de doença, foi Suso Iglesias, director da TV Galiza, organizador do espectácilo e ex-companheiro de José Afonso em muitos espectáculos, tocando gaita.

Entretanto - e numa altura em que se multiplicam as homenagens a José Afonso, agora que passam vinte anos sobre a sua morte -, a conimbricense Banda Futrica, projecto paralelo aos Ginga numa vertente mais acústica, apresenta o seu primeiro álbum, «Com Zeca no Coração», dia 30 de Abril no Convento de São Francisco, em Coimbra. O álbum - em que participam como convidados Isabel Silvestre, Helena Lavouras, Emiliano Toste, Luís Peixoto, Luis Ferreira e Gaiteiros da Espiral - é, segundo a banda, um tributo «àquele que tanto nos ensinou através da sua música e poemas! Foi em Coimbra que Zeca Afonso, ainda estudante, teve os primeiros contactos com a dureza da vida do povo, dos “futricas” de Coimbra». O álbum da Banda Futrica sucede a outros lançamentos discográficos que têm José Afonso como mote e inspiração - dos Frei Fado d'El Rei, Couple Coffee e Erva de Cheiro - e a espectáculos baseados na sua obra assinados pelo grupo Drumming, a fadista Cristina Branco e o Opus Ensemble, entre muitos outros. Venham mais...

18 abril, 2007

Haydamaky, Tartit, Darko Rundek... - Primeiros Nomes Para o FMM de Sines



A pouco e pouco lá se vai sabendo - embora o anúncio oficial ainda não tenha sido feito - o que vai passar este ano por Sines, no Festival de Músicas do Mundo (em Julho, de 20 a 22 em Porto Covo e de 23 a 28 em Sines). Um dos primeiros nomes confirmados, pelo menos a julgar pela informação veiculada no seu site oficial, é o do poderosíssimo grupo ucraniano Haydamaky (na foto), que passa por Sines, mais propriamente por Porto Covo, no dia 22. Os Haydamaky, que o ano passado editaram o celebrado álbum «Ukraine Calling», misturam música tradicional ucraniana, fanfarras balcânicas, reggae, ska, dub e punk (há uma sombra dos Pogues a pairar por ali), numa festa interminável em que entram ao barulho acordeão, trompete, berimbaus, flautas, domra (uma espécie de balalaika), tsymbaly (o saltério ucraniano), bateria e instrumentos eléctricos. Outros grupos já avançados para o FMM deste ano - em informações colhidas no Crónicas da Terra e no Fórum Sons - são o do extraordinário grupo tuaregue, do Mali, Tartit (que actua dia 26 de Julho em Sines), autor do recente e lindíssimo álbum «Abacabok»; o cantor e compositor croata assombrado pela chanson e pelo rock de expressão francesa Darko Rundek (que actua em Porto Covo, a 20 de Julho), autor, também o ano passado, do estranhíssimo álbum «Mhm A-ah Oh Yeah Da-Da (Migration Stories and Love Songs)»; e do contrabaixista de jazz Carlos Bica e do seu grupo luso-germânico Azul, que tocam no dia 26, em Sines. Está a tomar forma.

Cromos Raízes e Antenas XVII


Este blog continua hoje a publicação da série «Cromos Raízes e Antenas», constituída por pequenas fichas sobre artistas, grupos, personagens (míticas ou reais), géneros, instrumentos musicais, editoras discográficas, divulgadores, filmes... Tudo isto sem ordem cronológica nem alfabética nem enciclopédica nem com hierarquia de importância nem sujeita a qualquer tipo de actualidade. É vagamente aleatória, randomizada, livre, à vontade do freguês (ou dos fregueses: os leitores deste blog estão todos convidados a enviar sugestões ou, melhor ainda!, as fichas completas de cromos para o espaço de comentários ou para o e-mail pires.ant@gmail.com - a «gerência» agradece; assim como agradece que venham daí acrescentos e correcções às várias entradas). As «carteirinhas» de cromos incluem sempre quatro exemplares, numerados e... coleccionáveis ;)


Cromo XVII.1 - Clannad



Fala-se em Clannad e a maior parte dos puristas da folk arregaça as mangas, saca das pistolas e encontra logo mil palavrões para caracterizar o grupo irlandês (criado em Gweedore, em 1970). E, diga-se, muitas vezes com razão: os últimos muitos anos do grupo assistiram a uma sucessiva e imparável descida dos Clannad até territórios demasiadas vezes escorregadios ou duvidosos. Não que a música de fusão, como ideia, seja má - há inúmeros grupos e artistas de fusão que fazem música belíssima. O problema é quando a fusão é feita numa chinela. Fora disso, a verdade é que o início dos Clannad (liderados pela cantora Máire Brennan e o seu irmão Ciarán), nos anos 70, levou muita gente para a folk. E a sua continuação - com outra mana Brennan, a cantora Enya, também no barco, durante os anos 80, quando a pop e a new age já espreitavam pelo meio da música tradicional irlandesa -, também. Devemos-lhes, ao menos, isso, e já é muito.


Cromo XVII.2 - Frances Densmore



Graças ao fonógrafo de Edison (e de outros, numa longa história que não vem aqui ao caso), desde o final do séc.XIX podemos ter acesso a gravações vindas de épocas e de locais muito diferentes daqueles em que vivemos. E, graças a essa invenção técnica, muitos etnomusicólogos deixaram de tomar notas em cadernos e avançaram determinados para o terreno gravando a música que existia à sua volta. Uma das pioneiras desta busca foi Frances Densmore (nascida em Red Wing, Minnesota, Estados Unidos, a 21 de Maio de 1867, falecida em 1957), que consagrou boa parte da sua vida ao registo da música dos índios norte-americanos, um gosto e uma missão que lhe veio do seu contacto com os índios Sioux durante a infância. Numa altura - o início do séc.XX - em que os índios eram, se já não massacrados, utilizados como atracções de circo e vítimas de uma aculturação forçada, Frances Densmore ajudou a preservar muita da sua cultura original.


Cromo XVII.3 - Taiko



Os tambores Taiko - nos últimos anos bastante difundidos no Ocidente através dos deslumbrantes espectáculos do grupo Kodo - são originários do Japão, onde são utilizados tanto na música tradicional como clássica. Tambores com dupla face, percutidos com grossas baquetas de madeira, têm vários tipos e tamanhos (os maiores obrigam os músicos que os utilizam a um esforço físico tremendo, sendo esta execução considerada quase uma arte marcial) e como principal característica o facto das peles percutidas estarem muito esticadas devido ao clima quente e húmido dos Verões japoneses, altura em que decorrem as principais festividades naquele país. A utilização generalizada dos tambores taiko remonta à Idade Média do Japão, em que era usado como um instrumento que ajudava à marcha e motivação das tropas. Anteriormente, o taiko era percutido para afastar a peste das searas ou chamar a chuva e muita gente acreditava que o espírito dos seus antepassados vivia dentro destes tambores.


Cromo XVII.4 - Lhasa de Sela



A extraordinária cantora canadiana Lhasa de Sela (ou, simplesmente, Lhasa) é o produto quase natural de uma ascendência híbrida e de um início de vida aventuroso. Nascida em 1972, com sangue mexicano e judeu-libanês-americano, em Big Indian, Nova Iorque (Estados Unidos), Lhasa passou os primeiros anos da sua vida em viagem pelos Estados Unidos e pelo México, juntamente com os pais e as suas três irmãs. Aos vinte anos, Lhasa radica-se no Quebeque, Canadá, depois de ter conhecido o seu parceiro de vida e aventuras musicais Yves Desrosiers, com quem viria a gravar o lindíssimo álbum «La Llorona» (1998) - onde a memória das canções que ouviu no México é uma constante, mesmo que mesclada com outros elementos, da música klezmer ao rock. Nos mais recentes «The Living Road» (2003) e «Lhasa» (2009), a música mexicana continua presente mas diluída entre outras influências, como a «chanson» francesa, a folk norte-americana e o rock independente.

17 abril, 2007

José Mário Branco - Mudar de Vida...



José Mário Branco (aqui em mais uma foto de Lia Costa Carvalho) apresenta no Porto, sua terra-natal, o espectáculo «Mudar de Vida». A convite de Pedro Burmester, José Mário - uma das últimas memórias, e a mais importante, que nós temos de um tempo em que a música era também intervenção, inteligência, informação, para além de ser muito, às vezes quase demasiado, boa música - criou um espectáculo inspirado no mote «Música e Revolução» (...como se todos os espectáculos de José Mário Branco não o fossem...), que é apresentado dia 30 de Abril na Casa da Música. A base do espectáculo é o último álbum de José Mário, «Resistir É Vencer», mas não se resumirá a ele e incluirá, claro, alguns mergulhos no passado da sua música, que é também a nossa. Com José Mário estarão neste concerto os músicos - uma selecção A da música nacional - José Peixoto (Madredeus e Sal, guitarra), Carlos Bica (contrabaixo), Rui Júnior (O Ó Que Som Tem? e mentor do Tocá Rufar, percussões), Filipe Raposo (piano e teclados), João Pires (violoncelo), Guto Lucena (flauta e saxofones soprano, alto e tenor) e José Manuel David (Gaiteiros de Lisboa, trompa e gaita-de-foles), para além do grupo coral Canto Nono (que teve em José Mário Branco o seu produtor e com ele colaborou em várias ocasiões) e vários elementos do grupo de percussões Tocá Rufar, numa ligação entre o palco e a plateia. Fazendo nossas as palavras do comunicado de imprensa da Casa da Música, «José Mário Branco é um artista do seu tempo e da sua comunidade. E este tempo não é de introspecção, mas sim de denúncia ("isto não é sociedade que se apresente"), e de acção (é preciso mudar de vida). A dor da Humanidade - tema recorrente em "Resistir É Vencer" - e o sistema social que dessa dor se alimenta, aparecem agora estruturados mais racionalmente. Porque, quando tudo parece absurdo no mundo em que vivemos, a racionalidade impõe a Revolução social como "uma simples questão de bom senso". Mudar de Vida terá, portanto, como tema nuclear, o direito à rebelião: quando a sociedade é injusta, a Revolução é já um princípio de Justiça». Mais informações aqui.

16 abril, 2007

Terrakota - Num Comboio (Ascendente)



Os Terrakota - um dos mais importantes grupos de música híbrida, mestiça, multireferencial nascidos no nosso país - lança em Maio o seu terceiro álbum, «Oba Train». Caracterizado como um álbum «com inspirações de várias geografias - Jamaica, Cuba ou Brasil - e com uma diversidade de sonoridades - árabes, flamencas ou indianas - que recorre à musicalidade própria de muitas línguas - português, yoruba, wollof, francês, inglês ou o espanhol» e gravado nos estúdios Toolateman (dos Blasted Mechanism), nele participam como convidados, segundo avança o blog A Trompa, o jamaicano U-Roy (que tem como cognome «The Originator», por ser considerado como o precursor dos MCs), Conductor (dos Buraka Som Sistema e Conjunto Ngonguenha) e Ikonoklasta (do Conjunto Ngonguenha). O primeiro single retirado de «Oba Train» é o tema «A Verdade», um entre vários temas do novo disco que os Terrakota vão mostrar proximamente no Club Mau Mau, Porto, dia 21 de Abril, durante o festival de reggae Roots & Culture. O festival celebra dois anos do Portal do Reggae, com receitas a reverter a favor da Comunidade Aldeias S.O.S. - Crianças de Portugal e nele participam ainda Quaiss Kitir, Human Chalice e Stepacide. «Oba Train» tem edição da Gumalaka, é distribuído pela Compact Records e promovido através da Rádio Fazuma, que já tem disponível muita informação sobre o álbum, aqui.

14 abril, 2007

Cordel do Fogo Encantado em Viseu



E mais uma boa nova colhida directamente no Crónicas da Terra: o extraordinário grupo brasileiro Cordel do Fogo Encantado - que, o ano passado, encantou (ui, usei mesmo a palavra «encantou»?) a multidão que os via no FMM de Sines - regressa ao nosso país para um concerto no Teatro Viriato, em Viseu, dia 15 de Junho. O concerto do Cordel do Fogo Encantado - grupo do Pernambuco cuja música, indefinível, cresce até aos céus ou aos infernos através do elevadíssimo jogo poético e teatral do seu vocalista, Lira Paes - faz parte de um festival em que, ainda segundo o Crónicas da Terra, também actua o grupo vocal feminino búlgaro Angelite, os mestres da música de Tuva Huun-Huur-Tu e o grupo russo Moscow Art Trio, todos no dia 16 de Junho. Mais informações, quando as houver, aqui.

13 abril, 2007

Tinariwen e Bassekou Kouyate - O Mali em Guitarras Eléctricas e N'gonis



Do riquíssimo alfobre que é a cena musical do Mali, os primeiros nomes que nos vêm à memória são os de Ali Farka Touré, Toumani Diabaté, Salif Keita, Afel Bocoum, Oumou Sangaré, Issa Bagayogo, Amadou & Mariam, Boubacar Traoré, Tartit, Rokia Traoré... De um não mais acabar de nomes e estilos diferentes. Mas, desde há alguns anos, outro nome está a impor-se como fundamental e diferente nesse cacharolete, o dos tuaregues Tinariwen (na foto). E, agora, um outro nome em crescimento imparável, o do mestre do n'goni Bassekou Kouyate.

TINARIWEN
«AMAN IMAN»
Independiente/Megamúsica

Os primeiros trabalhos discográficos dos Tinariwen chegados à ribalta internacional, «The Radio Tisdas Sessions» e «Amassakoul», mostravam já, claramente, as potencialidades destes tuaregues armados de guitarras eléctricas e da sua música feita de gnawa, de música árabe, da tradição própria (tuaregue) e de outras músicas apanhadas em rádios a pilhas: os blues, o rock psicadélico, o rock ácido da Costa Oeste dos Estados Unidos dos anos 60. Mas nenhum deles tinha o fulgor, a chama, a verdade que está presente no novo álbum «Aman Iman» (que tem como sub-título revelador «Water Is Life»). Em «Aman Iman», os Tinariwen fazem uma música muito mais verdadeira, directa, activa, «in your face», e dão-nos uma lição de música sem fronteiras nem grilhetas nem auto-censura de espécie nenhuma. «Aman Iman» é um álbum que se ouve do princípio (o tema de abertura, «Cler Achel», é o resumo perfeito de tudo o que vem depois e parece uma jam de Jimi Hendrix com os Jefferson Airplane se todos eles tivessem nascido no Sahara, com Grace Slick incluída) ao fim (o tema de fecho, «Nak Assarhagh», é uma balada mágica e hipnótica, belíssima) sempre com um sorriso nos lábios, uma ginga em partes secretas do corpo e um tremor constante na alma, como se esta música nova, novíssima, fosse já uma nossa velha conhecida. «Aman Iman» é um álbum de rock? Seria, se o rock ainda fosse isto: aquilo por que vale ainda a pena viver e... viver fazendo disso uma forma de arte. (10/10)


BASSEKOU KOUYATE & NGONI BA
«SEGU BLUE»
Out Here Records

É tão estranho, este disco! Estranho porque há ali sons, sonoridades, sentimentos, estímulos, que nos parecem tão distantes (de onde vêm aquelas cordas todas?, e de onde vem aquela voz feminina inesperada, a de Amy Sacko, a mulher de Bassekou Kouyate?)... Porque vêm de algo distante, desconhecido, estrangeiro a todos nós, os que estamos habituados a ouvir a música do Mali feita por Ali Farka Touré (o nosso tio, amado tio, falecido mas presente tio, que nos reconciliou com os blues, o fado, a morna, com uma raiz qualquer que nos une a todos de uma maneira que ninguém sabe explicar muito bem qual é)... mas que vem, em Bassekou Kouyate e na sua banda de n'gonis, com um eco de reconhecimento - sim, apesar da distância e da estranheza - aqui tão próximo, quase linear na sua, nesta, proximidade. Ouvimos «Segu Blue» e estamos a ouvir o álbum «Cavaquinho» de Júlio Pereira, ou um fado qualquer de vez em quando, ou alguma coisa gravada no nordeste do Brasil (com cordas lá dentro) ou um banjo tocado por Earl Eugene Scruggs ou uma (espanto!)... tuna de Castelo Branco dos anos 70 (não universitária, portanto) feita de mil cordas e mil sentimentos e mil sons. O n'goni - também chamado gaaci ou ganbare - tem apenas três ou quatro cordas (consoante a região de onde é originário) e sublinha as narrativas de amor e de guerra nas mãos dos griots. E o xamane Bassekou Kouyate, companheiro de Ali Farka em «Savane» e de Diabaté na Symmetric Orchestra, transporta-nos a uma outra dimensão, esta, sempre tão distante e tão próxima de nós... E é nela que queremos estar. (8/10)

12 abril, 2007

Toques do Caramulo Com Álbum ao Vivo



Um dos mais interessantes e criativos grupos portugueses a pegar na música tradicional como matéria-prima para dela fazer uma música nova, Toques do Caramulo (na foto, de Mário Pires, da Retorta), acabou de lançar um álbum ao vivo, gravado em Águeda, no espaço d'Orfeu, casa-mãe deste projecto. O álbum, «Toques do Caramulo é Ao Vivo!», está a ser apresentado na Galiza, numa digressão que começou ontem em Vigo e segue agora para Santiago de Compostela (hoje, dia 12, Casa das Creches), Illa de Arousa (dia 13, Con do Moucho), Lalín (dia 14, Barriga Verde), O Porriño (dia 20, Bar Liceum) e Melides (dia 21, Pub Gatos), antes de descer ao sul de Portugal para concertos em Sines (dia 24, Avenida da Praia) e Lisboa (dia 25, Teatro da Luz). «Toques do Caramulo é Ao Vivo!» é uma edição da d'Orfeu e, para além dos músicos do grupo (Luís Fernandes, Aníbal Almeida, Gonçalo Rodrigues, Francisco Almeida, Lara Figueiredo, Ricardo Coutinho e Miguel Cardoso) inclui uma participação especial do actor, comediante a cantor belga Bernard Massuir.

11 abril, 2007

Baba Zula no Festival Islâmico de Mértola



Os Baba Zula (na foto), um dos grupos de ponta da renovação da música turca, são um dos destaques da 4ª edição do Festival Islâmico de Mértola, que decorre nesta vila alentejana de 17 a 20 de Maio. Um Festival que, para além das deliciosas comidas tradicionais mediterrânicas e do animado souk que por estes dias transforma Mértola numa localidade do norte de África, apresenta ainda mais alguns mui aconselháveis concertos, à noite, no Cais do Guadiana. Concertos do projecto In-Canto (com Luísa Amaro na guitarra portuguesa, Miguel Carvalhinho na guitarra clássica, Hugo Tristão na percussão árabe e Joana Grácio, bailarina de dança oriental) e do ensemble Adafina (projecto português que se dedica à música turca e árabe), na primeira noite; do novo Grupo Moulay Sheriff (liderado por este ex-membro dos marroquinos Nass Marrakech) e dos portuenses de trance acústico OliveTree, na segunda noite; da fabulosa cantora iraquina Aida Nadeem e dos já referidos Baba Zula (fazedores de um festivo e excitante híbrido de música tradicional turca, dub, rock e electrónicas), seguidos por uma sessão de DJ de Raquel Bulha, na noite de sábado. Todos os dias, e durante o dia, há também animação musical com Eduardo Ramos (Portugal) e os grupos Boukdir (de Marrocos) e Troupe Chelbi (da Tunísia). Espectáculos de cante alentejano e de violas campaniças, colóquios, exposições, teatro, oficinas e espectáculos de dança oriental, a inauguração do Centro de Estudos Islâmicos e do Mediterrâneo, a apresentação do Museu Virtual «À descoberta da Arte Islâmica» e a noite de Dikra (celebração islâmica aqui aberta à participação de pessoas que não professam essa religião) completam a programação deste festival. Mais informações aqui.

(Steel) Drumming Interpreta José Afonso



É um projecto originalíssimo: o colectivo de música erudita Drumming vai fazer uma extensa digressão com o espectáculo «Steel Drumming Toca Zeca Afonso», em que o grupo - rebaptizado Steel Drumming porque vai apenas usar as steel drums tradicionais de Trinidad e Tobago - interpreta temas de José Afonso, acompanhado pelos cantores JP Simões, Miguel Guedes (dos Blind Zero, aqui a cantar, claro, em português) e a cantora de jazz Sofia Ribeiro - sempre só um deles em cada espectáculo. Os temas têm arranjos de Mário Laginha, António Augusto Aguiar, Pedro Moreira, Bernardo Sassetti, Vasco Mendonça e Telmo Marques e, para além das versões de temas de José Afonso, o espectáculo incluirá ainda peças originais inspiradas na obra do autor de «Cantigas do Maio» compostos por Nuno Côrte-Real, Carlos Guedes e Jeffery Davis. O Steel Drumming - formação composta pelos percussionistas Rui Rodrigues, Paulo Costa, João Tiago, Juca Monteiro e António Sérgio - e os cantores convidados estreiam o espectáculo no Porto (Casa da Música, 25 de Abril) e apresentam-no depois em Faro (Teatro Municipal, 27 de Abril), Sines (Centro de Artes, 28 de Abril), Lisboa (Centro Cultural de Belém, 30 de Abril), Alcobaça (Cine-Teatro, 1 de Maio), Entroncamento (Cine-Teatro S. João, 5 de Maio), Palmela (Cine-Teatro, 12 de Maio), Seixal (Fábrica Mundet, integrado no Festival Portugal a Rufar, 2 de Junho) e Estarreja (Cine-Teatro, 17 de Junho). Mais informações aqui.

09 abril, 2007

Camané Canta Outras Canções



Depois de em 2004 ter levado à cena o espectáculo «Outras Canções» - em que interpretava canções portuguesas e brasileiras fora do espectro do fado -, Camané regressa a uma fórmula semelhante com «Outras Canções II», em que vai interpretar temas em português (de Tony de Matos, Chico Buarque e Elis Regina, por exemplo) mas também canções em outras línguas, dando voz a temas popularizados por Frank Sinatra, Chet Baker ou Jacques Brel e não sendo descabido esperar também canções de Serge Gainsbourg, dos Beatles e até dos Divine Comedy. Nesta aventura, que ocupa o palco principal do Teatro Municipal de S.Luiz, em Lisboa, de 27 de Abril a 6 de Maio, Camané é acompanhado pela Orquestra Sinfónica Portuguesa e por uma banda de músicos vindos do jazz formada por Filipe Melo (piano), Mário Delgado (guitarra), Bernardo Moreira (contrabaixo) e Alexandre Frazão (bateria). A direcção musical é de Pedro Moreira e os arranjos de Pedro Moreira, Filipe Melo, Mário Laginha e Bernardo Sassetti. Mais informações aqui.

06 abril, 2007

Cromos Raízes e Antenas XVI


Este blog continua hoje a publicação da série «Cromos Raízes e Antenas», constituída por pequenas fichas sobre artistas, grupos, personagens (míticas ou reais), géneros, instrumentos musicais, editoras discográficas, divulgadores, filmes... Tudo isto sem ordem cronológica nem alfabética nem enciclopédica nem com hierarquia de importância nem sujeita a qualquer tipo de actualidade. É vagamente aleatória, randomizada, livre, à vontade do freguês (ou dos fregueses: os leitores deste blog estão todos convidados a enviar sugestões ou, melhor ainda!, as fichas completas de cromos para o espaço de comentários ou para o e-mail pires.ant@gmail.com - a «gerência» agradece; assim como agradece que venham daí acrescentos e correcções às várias entradas). As «carteirinhas» de cromos incluem sempre quatro exemplares, numerados e... coleccionáveis ;)


Cromo XVI.1 - João Gilberto



Há uma lenda que conta que o gato de João Gilberto (na foto, com Astrud Gilberto) se suicidou, atirando-se de uma janela, por já não poder ouvir o seu dono ensaiar mais vezes, e de forma obsessiva, a canção «O Pato» (uma outra versão diz que o gato apenas fugiu de casa). Mas, como todas as lendas, esta serve pelo menos para mostrar como o brasileiro João Gilberto Prado Pereira de Oliveira (nascido a 10 de Junho de 1931, perto da Bahia) é um maníaco da perfeição. Inventor da bossa-nova (ao lado de Tom Jobim e de Vinicius de Moraes), cantor e guitarrista, João Gilberto notabilizou-se essencialmente pela sua interpretação pessoalíssima de muitas das canções compostas por Jobim e Vinicius. Ponto muito alto da sua carreira foi o maravilhoso álbum «Getz/Gilberto» (1964), com o saxofonista de jazz norte-americano Stan Getz, Jobim e a sua mulher Astrud Gilberto.


Cromo XVI.2 - Sainkho Namtchilak



A fabulosa cantora Sainkho Namtchylak é uma das principais embaixadoras da música de Tuva (juntamente com os Yat-Kha, os Huun-Huur-Tu e os Chirgilchin), embora muitas vezes seja acusada de se estar a afastar gradualmente das suas raízes - o que, de certo modo, é verdade, não tanto pela inclusão de electrónicas na sua música mas mais pela sua crescente tendência em abandonar o «throat-singing» da sua região natal em favor de uma voz mais «normal». Mas isso não impede que Sainkho (nascida em 1957 numa aldeia do Sul da Mongólia) tenha uma carreira em que soube levar - às cavalitas numa voz que abrange sete oitavas - a música de Tuva aos quatro cantos do mundo, mesmo que misturada com electrónicas, jazz de vanguarda ou música experimental. Álbuns aconselhados: «Tunguska-guska», «Lost Rivers», «Out of Tuva» e «Who Stole The Sky».


Cromo XVI.3 - Juju Music



A «juju music» é a forma musical mais conhecida da Nigéria, descendendo directamente dos ritmos tradicionais da etnia Yoruba e fixando-se nos anos 20 do século passado como uma forma autónoma da «palm-wine music» (popular em países como a Serra Leoa ou Libéria), tendo artistas como Tunde King e Ojoge Daniel gravado discos de juju nessa década. Com o advento dos instrumentos eléctricos, a «juju music» avança numa nova direcção, mais ocidentalizada mas sem por isso perder as suas principais características rítmicas originais, sendo dada a conhecer no exterior por artistas como o importantíssimo King Sunny Adé (na foto), I.K. Dairo, Ebenezer Obey ou J.O. Araba. Mas outros nomes da juju são também de realçar como Admiral Dele Abiodun, Comfort Omoge, Shina Peters, Wale Thompson (que funde juju com hip-hop), Emperor Wale Olateju, Chief Zebulon Omoranmowo ou Lady Balogun.


Cromo XVI.4 - Dead Can Dance



O duo Dead Can Dance é, provavelmente, um dos grupos rock que mais gente levou (juntamente com os Pogues) a interessar-se por outros géneros musicais, nomeadamente a chamada «world music». Formado por Lisa Gerrard e Brendan Perry, o duo iniciou a sua carreira em Melbourne, na Austrália, em 1981, mas pouco tempo depois fixou-se em Londres engrossando os quadros da histórica 4AD. Fundindo, ao longo dos tempos, géneros musicais tão diferentes quanto a pop, a folk, música medieval e renascentista e inspirações vindas um pouco de todo o mundo, os Dead Can Dance foram por vezes erradamente enfiados nas correntes gótica e dark-wave devido à beleza intemporal, fluida, etérea de muitos dos seus temas, muitos deles coroados pela voz mágica de Lisa Gerrard. O fim chegou, oficialmente, em 1999 (o último álbum, «Spiritchaser», é de 1996), mas em 2005 os dois ainda fizeram uma digressão conjunta.

05 abril, 2007

Mayra Andrade, Baaba Maal, Bassekou Kouyate - No África Festival



Vem aí mais um grande África Festival, desta vez marcado para o fim-de-semana de 28, 29 e 30 de Junho, na Torre de Belém, em Lisboa. Depois de em edições anteriores nos ter dado concertos de, entre outros, Ali Farka Touré, Zap Mama, Tiken Jah Fakoly, Stella Chiweshe e Bonga, o África Festival traz desta vez espectáculos, no primeiro dia, da extraordinária nova cantora cabo-verdiana Mayra Andrade (que editou o ano passado o álbum de estreia «Navega») e da arte ancestral e hipnótica dos egípcios Músicos do Nilo. No segundo dia há lugar para a música angolana modernizada de Paulo Flores (que há poucos meses teve um álbum editado pela Frikyiwa de Frédéric Galliano) e para uma revelação da música maliana: o mestre do n'goni Bassekou Kouyate, companheiro de aventuras com Toumani Diabaté e o saudoso Ali Farka Touré, agora a lançar-se a solo com o seu grupo Ngoni Ba. Na terceira noite a cantora camaronesa Sally Nyolo apresenta-se com o seu novo projecto, Sally Nyolo & the Original Bands of Yaoundé, que deu origem ao álbum «Studio Cameroon», antes de subir ao palco o fabuloso cantor, guitarrista, percussionista e compositor senegalês Baaba Maal (na foto, de Adrian Boot), um dos mais talentosos fusionistas da música africana com sonoridades mais ocidentais. De referir que de 2 a 8 de Julho o África Festival - uma organização da EGEAC/Câmara Municipal de Lisboa - terá uma extensão, cuja programação ainda não está fechada, no Cinema S.Jorge.

Fátima Miranda no II Festival Voz de Mulher



A cantora espanhola Fátima Miranda (na foto, de Sigfrido Camarero) é, para já, o primeiro grande nome confirmado para o II Festival Voz de Mulher, que decorre no Teatro Aveirense, em Aveiro, nos dias 6, 7 e 8 de Julho, numa co-produção entre o grupo vocal feminino Segue-me à Capela e o Teatro Aveirense. O Festival, que teve o ano passado como cabeça-de-cartaz Meredith Monk, apresenta desta vez um concerto com outra desbravadora dos limites da voz, Fátima Miranda, uma cantora que visita territórios da música experimental, erudita, étnica, sempre de uma forma original, com um trabalho de envolvimento cénico notável e um enorme sentido de humor. Para além do concerto, intitulado «Diapasión», Fátima Miranda fará um colóquio, «Vocalista ou Boca-lista (A Pele da Voz) - Tudo o que gostaria de saber sobre a voz e sempre teve vergonha de perguntar: Técnica, Ritmo, Gesto, Difonias, Respiração, Musicalidade, Escuta, Emoções, Palco, Processo Criativo, Disciplina, Cuidados, Partituras». O cartaz, que ainda não está fechado, contará ainda, entre concertos e workshops, com uma sessão de DJs de Luís Rei e António Pires (pois, o autor deste blog) na Noite Borato de Sódio. Para mais informações sobre o Voz de Mulher - um «Festival (que) pretende reunir Cantoras que usam a Voz como forma principal da sua expressão artística; mulheres que tenham desenvolvido investigação e ou experimentação em torno da Voz, não só como fonte sonora do canto e da palavra, mas também como instrumento capaz de criar uma linguagem musical e artística própria» - pode ficar atento a este blog ou aos sites do Teatro Aveirense e das Segue-me à Capela.

04 abril, 2007

Intercéltico de Sendim - Do País Basco à Irlanda



E mais uma grande notícia sacada às Crónicas da Terra: o 8º Festival Intercéltico de Sendim decorre este ano nos dias 3, 4 e 5 de Agosto, no Parque das Eiras, com actuações, no primeiro dia, dos Trasga (grupo da Terra de Miranda, Portugal), dos Tradere (de Castela e Leão) e do excelente grupo irlandês/norte-americano Solas (na foto). No dia seguinte actuam os Dazkarieh (Portugal), o basco da trikitixa voadora Kepa Junkera e os veteranos e festivos irlandeses Four Men and A Dog. Também no dia 4 há animação de rua com a Banda de Gaitas de Ortigueira e no domingo, a encerrar o Festival, Célio Pires (gaita-de-foles, fraita e sanfona) dá o envolvimento musical a uma missa tradicional mirandesa. Paralelamente, as noites na Taberna dos Celtas serão, como é habitual, animadas com jam-sessions; decorre a exposição fotográfica «A Máscara Ibérica»; a exposição documental «José Afonso - Vinte Anos Depois»; haverá passeios nas arribas do Douro; bancas de artesanato, produtos naturais, discos, livros, intrumentos musicais e bebidas («licor celta e outras poções mágicas») no Parque das Eiras; e haverá ainda apresentações de discos e livros, conferências, debates e workshops. Mais informações aqui.

03 abril, 2007

Amélia Muge, Janita Salomé e Ala dos Namorados - Por Onde Anda a Música Popular Portuguesa



A expressão MPP, ou Música Popular Portuguesa, já é antiga mas não deixou de fazer sentido: MPP é a música que vai às raízes da música portuguesa, sejam elas quais forem, e lhes dá uma urbanidade (por ser feita nas cidades) ou modernidade (por ser feita... agora) ou globalidade (por saber de outras músicas neste mundo) qualquer. E estes três nomes - Amélia Muge (na foto), Janita Salomé e a Ala dos Namorados -, todos com álbuns recentemente editados, entram todos bem e cada vez melhor nesta categoria. É música portuguesa e não só, e popular assim o povo a receba como tal - e devia.


AMÉLIA MUGE
«NÃO SOU DAQUI»
Vachier & Associados

Amélia Muge tem já muitos anos de carreira mas poucos álbuns a fazer justiça à sua voz e ao seu talento de compositora. Uma voz fabulosa e uma compositora das melhores que a música portuguesa agora tem. No novo álbum, «Não Sou Daqui», Amélia Muge não renega nada do seu passado e da sua matriz - a música feita matéria artística livre e eterna de José Afonso e de Fausto e de Sérgio Godinho (e há uma frase tão reveladora na segunda canção deste álbum: «só neste país»...), mas também de Laurie Anderson, embora esta não seja completamente óbvia. E uma vontade enorme, imensa, de ir mais além. Na música de Amélia Muge, aqui e ali, há blues e música árabe e fado (e não só no óbvio «Fadunchinho», que tem um final delicioso), há experimentalismos a espreitar detrás de um piano, há baladas lindíssimas («Entre o Deserto e o Deserto» é só uma delas), há uma homenagem a Caetano Veloso e uma outra aproximação à música brasileira («Não Sou Daqui, Mas...»), há uma escolha criteriosa de poemas (ela própria escreve algumas letras, sim, mas também há poemas de Hélia Correia, António Ramos Rosa, Sophia de Mello Breyner e Eugénio Lisboa) e há uma equipa de luxo em que entram o arranjador e percussionista António José Martins (companheiro de vida e aventuras de Amélia há muitos anos), José Manuel David (dos Gaiteiros de Lisboa), o omnipresente pianista Filipe Raposo, o guitarrista José Peixoto e o baixista Yuri Daniel. (7/10)


JANITA SALOMÉ
«VINHO DOS AMANTES»
Som Livre

Janita é muito bem capaz de ser o melhor cantor português da actualidade. Tem uma voz vibrante, quente, maleável, alentejana e ao mesmo tempo árabe e andaluza e fadista e do mundo todo. E, sabe-se desde há muito, é também um compositor maior, maduro, com uma ideia de música - uma ideia que não o leva, nunca o levou, para a facilidade ou o acomodamento ou a preguiça. Em «Vinho dos Amantes», o seu novo álbum, Janita volta a surpreender com um álbum em que um mote, o vinho, é visitado em poemas ancestrais, do chinês Li Bai ou do grego Anacreonte, a poemas mais contemporâneos de Charles Baudelaire, António Aleixo, Hélia Correia, Carlos Mota de Oliveira, José Jorge Letria, Camilo Pessanha e dele próprio, Janita Salomé. Um álbum em que Janita abandona o seu característico canto melismático (mas sem por isso deixar de mostrar uma voz incomparável) e avança para uma música em que aparecem uns blues arraçados de música árabe, kissanges revistos via José Afonso, canto gregoriano em loops tribais-repetitivos com spoken-word por cima («Embriagai-vos», e aqui sim, também com melismas no final), jazz com voz demente («Fragmentos»), o coro alcoólico de «No Banquete» (em que entram o mano Vitorino, Rui Veloso e Jorge Palma) ou a canção portuguesa-mais-portuguesa-não-há que é «Quadras». (8/10)


ALA DOS NAMORADOS
«MENTIROSO NORMAL»
Universal Music Portugal

Há, pelo menos, três boas notícias associadas a este novo álbum da Ala dos Namorados: a qualidade do projecto não sofreu com a saída de João Gil (agora empenhado na Filarmónica Gil, também com um álbum novo a sair por estes dias); os poemas - belíssimos! - continuam a ser assinados por João Monge... e também por Carlos Tê e Nuno Guerreiro; o cantor, Nuno Guerreiro, está a perder o falsete juvenil e está a cantar muito, muito, bem. E ainda outra boa notícia: os músicos são dos melhores que este nosso país tem: Mário Delgado na guitarra, Alexandre Frazão na bateria, Massimo Cavalli no contrabaixo, Ruben Santos no trombone e, claro, Manuel Paulo, o principal compositor da Ala, nas teclas. E «Mentiroso Normal» é um álbum raro na música portuguesa, um álbum em que há imensos singles óbvios - singles entendidos como «muito boas canções, pois» - num curto espaço de tempo: a lindíssima balada «Caçador de Sóis», o country-pop swingante de «Sem Vintém», o fado mudado de «Voltar a Ser» (fado que também é matriz fantasmática de «Matas-me»), o delicioso lounge abrasileirado de «Mentiroso Normal» (com a cabo-verdiana Nancy Vieira a dar luta a Guerreiro), o fabuloso divertimento em queda livre que é «Bricabraque e Pechisbeque» (com Jorge Palma e José Medeiros a fazerem contrapontos inesperados à voz de Guerreiro) ou a versão de «13 anos, 9 Meses» de José Mário Branco. (8/10)

02 abril, 2007

Vozes de Outro Mundo na Guarda



Vozes de Outro Mundo é o apropriado nome de um ciclo que vai decorrer entre 8 e 22 de Junho no Teatro Municipal da Guarda, como informa o Crónicas da Terra. Com programação de Américo Rodrigues - ele próprio um investigador e experimentador dos limites da voz -, o Ciclo inicia-se no dia 8 com a extraordinária cantora canadiana, da tribo inuit, Tanya Tagaq (na foto) e o «throat-singing» tradicional do seu povo - Tagaq colaborou em «Medúlla», de Björk, e ao vivo com o Kronos Quartet, para além de ter dois álbuns em nome próprio, «Iluani Erren» e «Sinaa». Dia 9 é a vez do beat box vocal do inglês Shlomo, que também colaborou com Björk em «Medúlla» e é considerado como uma «one-man vocal orchestra» - nos seus concertos costuma apresentar material próprio e versões de temas de Snoop Dogg, White Stripes ou... Backstreet Boys (antes, à tarde, Shlomo orienta uma oficina de beat box). Dia 20 é a vez dos Huun-Huur-Tu, grupo de vozes de Tuva desde há muitos anos na linha da frente da divulgação do «throat-singing» desta região do norte da Ásia - ao lado dos Yat-Kha e de Sainkho -, juntando às suas vozes de mil harmónicos instrumentos tradicionais de Tuva. Finalmente, dia 22, o ciclo encerra com o espectáculo «La Voix Est Libre», do belga Bernard Massuir, espectáculo em que «a voz é o instrumento explorado das mais variadas formas, criando diferentes atmosferas e universos. Humor e minimalismo para ler entre linhas… musicais». Mais informações aqui.