31 outubro, 2007
«Fados» de Carlos Saura - Da Tela Para o Palco
Para além de uma digressão em Espanha, com alguns dos nomes mais sonantes do fado - Mariza e Camané, entre outros -, como contraponto «ao vivo» do filme «Fados», de Carlos Saura, outro espectáculo prepara-se para subir ao palco à boleia do filme do realizador espanhol, segundo informa a agência Lusa: o espectáculo «Casa de Fados», inspirado na cena que encerra o filme e que reúne os fadistas Vicente da Câmara, Maria da Nazaré, Ricardo Ribeiro, Ana Sofia Varela (na foto), Pedro Moutinho e Carminho, sendo esta - que se encontra agora fora de Portugal - substituída ao vivo por Tânia Oleiro e contando ainda com a participação especial de Margarida Bessa. «Casa de Fados» - produzido pela Uguru e pela El Caiman - tem estreia em Portugal marcada para dia 29 de Novembro, no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, com uma cenografia que incluirá a projecção de imagens do filme de Saura. A direcção musical é do guitarrista Pedro Castro, acompanhado por José Luís Nobre Costa (guitarra portuguesa), Jaime Santos (viola) e Joel Pina (viola-baixo). O mesmo espectáculo foi anteriormente apresentado em Espanha, em Julho, no Festival de Músicas de La Mar, em Cartagena, e a 19 e 21 de Outubro, em Las Palmas da Grande Canária. Antes disso, «Fados» terá uma projecção muito especial, com entrada gratuita, amanhã, quinta-feira, às 19h00, na Associação Cultural Moinho da Juventude, no Bairro da Cova da Moura, na Amadora, inserido nas comemorações dos vinte anos desta Associação, da qual faz parte o colectivo cabo-verdiano Kola San Jon, igualmente presente no filme.
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8 comentários:
É pena o filme "Fados" ser um equívoco que leva os intervenientes a embarcarem num produto artificial, surgido à boleia do filme...coisas de espanhóis a que os portugueses (como sempre) batem palmas...uma tristeza.
É bom que as pessoas vão ver o filme e tentem perceber porque é que o Saura filmou o Fado com seis nomes estrangeiros e a maioria das cenas acompanhadas de bailados espanhóis.
A primeira razão, tem a ver com a falta de nomes sonantes para poder vender a obra; a segunda, porque achou que o fado era demasiado estático e necessitava de dinâmica...
Isto, apesar de ter um consultor científico (Rui Vieira Nery) e um consultor musical (Carlos do Carmo) para o filme.
Das duas uma: ou o Saura não percebeu nada do que os consultores lhe disseram, ou percebeu demasiado bem e pensou que assim não vendia o produto.
Ora, como nestas coisas, os produtores não brincam em serviço, quiseram contrapartidas: nomes vendáveis no circuito estrangeiro da "world music" e danças para o mercado americano.
"The show must go on"...
Rui Mota:
Não vi o filme de Carlos Saura - e só não o vi, apesar da curiosidade, por ter uma relação de amor/ódio pessoal com o cinema que agora não vem para o caso -, mas já ouvi a banda-sonora, da qual gosto bastante: acho o dueto do Poveda com a Mariza arrepiante (sinto, pela primeira vez, uma ligação qualquer entre o fado e o flamenco, coisa que nunca tinha sentido antes... e mesmo sabendo que ambos os «estilos», apesar de próximos geograficamente, estão muito distantes em termos de origem e evolução histórica) e gosto muito das intervenções da Lila Downs e do Caetano Veloso, para além da curiosidade lindíssima de estar ali aquele grupo de cabo-verdianos, o Kola San Jon, a fazer uma ponte perdida (mesmo que não seja aquela!) entre África e o fado.
Isto para dizer que, para mim, a música não tem fronteiras nem me chateia que tenha sido um espanhol a realizar um filme sobre o fado. Repito: não vi o filme e até desconfio de que se tivesse visto não teria gostado... Não pelas «espanholices» nem pelos «estrangeirismos» mas porque não gostei do filme que ele fez sobre o... flamenco (!), ali tão próximo dele. Continuo a ter aquela ideia de que «trop de couleur distrait le spéctateur» e muita cor, muita dança, muita garridice... a mim também não me agrada. Mas a música do «Fados», pelo que ouvi na banda-sonora, a mim não me chateia nada...
É sempre bom «discutir» contigo :)
Um grande abraço
Claro que a música é boa. Com aqueles cantores e instrumentistas, nem podia ser outra coisa. O problema está no conceito do filme. Estamos a falar de cinema, mesmo que, em última instância, seja um filme musical.
Sou insuspeito, até porque gosto do Saura e já vi mais de uma dúzia dos seus filmes. Penso inclusivé que, tanto o "Sevilhanas" (1992), como o "Flamenco" (1995), são excelentes filmes. É verdade que, nessas obras, há um gosto marcado pela estética (artsy pictures) mas também há paixão pelo objecto filmado. São filmes consistentes porque respeitam os géneros musicais escolhidos. Já em "Tangos" (1999) o argumento (pobre) não ajuda e a música só serve como ilustração. Em "Fados" o realizador mistura tudo, sem dar uma explicação (sumária que fosse) e o espectador, que desconheça a história, pensa que o Fado tanto pode ser português como mexicano. Ora isso é não é verdade. O problema não é ele ter usado estrangeiros, é tê-los usado para vender o filme. Alguém imagina um espanhol a fazer um filme sobre Flamenco com convidados portugueses? É este nosso "laissez-faire", que convidou o Saura e lhe deu 1 milhão de euros para fazer o filme, que é irritante. Se o Fado não tem figuras que venda, porque é que não foram buscar a Mísia ou a Cristina Branco? Porque é que a Amália está reduzida a um papel secundaríssimo e a Lucília do Carmo tem direito a primeiro plano? Porque é que a Mariza canta três canções e os outros cantores, uma cada um? Porque é que no dueto Mariza-Poveda, há uma bailarina espanhola a dançar Flamenco o tempo todo? Uma vergonha, paga com o nosso dinheiro.
Vai ver o filme e depois diz-me da tua opinião...
Pena a Carminho ter sido substítuida...!!!
Os "fados" são outros e esperemos que regresse ainda mais inspirada:
http://soldadosdocozido.blogspot.com/
;)
Filme?! Mas qual filme?! :) Aquilo não é um filme! É a banda sonora (vá lá, o video-clip da banda sonora) de um filme que não existe. Portanto, António, se já ouviste o CD, pouco mais tens a acrescentar!
Não me interpretem mal: a música é boa, as interpretações também (de um modo geral), as danças, as imagens e a envolvência também. Eu gostei! Só não encaixa no meu conceito de "filme". Para ser um musical falta-lhe o enredo e para ser um documentário falta-lhe a informação. Mas é, sem dúvida, uma excelente compilação de video-clips!
Confesso que não conheço os outros (pseudo-)musicais do Saura e que fiquei com vontade de os ver... não pelo prazer cinéfilo, mas pelo gosto pela dança :)
Por fim, e à parte de polémicas financeiras e patrióticas, acho que aquilo ao vivo daria um extraordinário espectáculo de palco - tudo! e não apenas a recriação da casa de fados. Aliás, a casa de fados, a escola da Brigada e o passeio alfacinha de Carlos do Carmo são os únicos ambientes de que me recordo, tudo o resto é clara e assumida filmagem de estúdio - o que se enquadra num concerto ou num bailado de palco. Aquilo anda tão longe de ser um filme, que nem à peça de teatro precisamos de ir...
[E na linha do que aqui desabafei, quando fui ver o filme foi isto que me saiu...]
Rui Mota, Curiosa e Cristina:
Muito obrigado - mesmo! - por terem transformado este post com uma notícia simples num espaço de debate sobre o filme do Carlos Saura. Espero por mais contribuições, vossas ou de outros leitores do R&A :)
E, Curiosa, obrigadíssimo pelo link para o blog da Carminho, em viagem por esse mundo fora, uma viagem de que ela me falou numa entrevista publicada neste blog há alguns meses. Fica aqui repetido o endereço do blog dela:
http://soldadosdocozido.blogspot.com/
Estou de acordo com a opinião da Cristina. Para mim um filme é, em última instância, uma história contada em imagens. Mesmo um documentário pode ter uma história. Dito de outra forma: "cinema é montagem".
Ora o filme "Fados", para além de não ter uma "montagem" explícita (e, nesse sentido, ser uma sucessão de vídeoclips) é pouco rigoroso historicamente. Não explica porque é que o "Fado" foi dançado há cem anos, nem porque é que as influências africanas (na música) foram determinantes na sua génese. Troca tudo: põe dançarinos do ballet espanhol (!?) a ilustrar fadistas considerados "estáticos" (Marceneiro, Camané, etc.) para dar uma (pseudo)dinâmica ao filme; e utiliza cantores estrangeiros (óptimos, sem dúvida) a interpretar fados portugueses...
Mas o que é que isso tem a ver com a universalidade do Fado? Nada! Foi da influência dos diversos estilos (trovas medievais, modinhas, lundum, fado batido e umbigadas) que nasceu o fado tal como o conhecemos hoje. O realizador dá a entender o contrário: que o Fado saiu daqui e se espalhou pelo Mundo. A história de pernas para o ar!
Ou seja, Saura teve medo do filme não vender se seguisse a cronologia histórica e fez um filme de "world music" para vender nos circuitos comerciais. Se o tivesse feito de livre vontade, ainda vá que não vá...mas ele fê-lo a convite dos portugueses, com dinheiros da CML e do Turismo Português e foi acompanhado por consultores reconhecidos (Ruy Vieira Nery e Carlos do Carmo).
Repito o que já escrevi atrás: Saura é (foi?) um bom realizador. A atestá-lo, os seus filmes das décadas de setenta (Cria Cuervos, Elisa Vida Mia, Ana e os Lobos) e dos anos oitenta (Deprisa, Deprisa, Táxi, Carmen e Ay Carmela!). Nos anos noventa, fez dois bons filmes musicais: Sevilhanas e Flamenco. Já aí usa o método da filmagem em estúdio e utiliza a sequência que repetiu em "Fados". Nada de novo em termos de inovação. Mas não é esse o problema, O problema é que ele nos filmes espanhóis foi íntegro e fez dois bons documentários sobre géneros musicais que conhece bem. No caso de "Fados", fez o que lhe apeteceu, perante a complacência dos patrocinadores portugueses...
RM
P.S. Os filmes de que falei, nunca passaram no circuito comercial português, mas já passaram na Cinemateca. Podem ser adquiridos em Vídeo/DVD através do site: "www.flamenco-world.com"
Bons visionamentos!
Gostei das observações do Rui Mota. conheço sobremaneira os estrangeiros que só pensam em fado como nova maneira de (eles)ganharem dinheiro.
Aliás, são como as pessoas que vieram para Portugal para fazer shows ''live'' na TV, e que depois se riem imenso no estrangeiro dos portugueses; ''aquilo lá é ouro - tudo o que ponha aqueles burros a chorar ...''
...é de voltar o estômago.
O Rui tem toda a razão: como dói quando os portugueses ainda por cima aplaudem....ou participam até.(o que não quero dizer que tenha sido o caso do António, ou desta conversa).
Cumprimentos a todos!
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