08 fevereiro, 2007
Bert Jansch, Waterson:Carthy e Robin Williamson - Velha Folk?... Nova Folk!
Há uma idade qualquer nos compositores/artistas/cantores em que tudo lhes parece correr mal - quando, entre algures os trinta e os quarenta e cinco anos (o «ratio» não é norma!), a música que antes faziam parece já não fazer sentido mas eles insistem em fazê-la. Mas há outra idade qualquer, às vezes perto dos cinquenta, às vezes perto dos sessenta anos, em que tudo volta a fazer sentido e os «velhos» compositores e cantores do passado voltam a uma boa forma surpreendente, criativa, revolucionária, nova de novo. Exemplos? Só na área do (chamemos-lhe) rock: Lou Reed, Bob Dylan, Patti Smith, Johnny Cash, Leonard Cohen, Marianne Faithfull, Scott Walker, David Bowie ou até - com um bocadinho de boa-vontade - os Rolling Stones. E, no caso da folk britânica, há três álbuns editados por veteranos em 2006 que voltam a pôr a «velha» folk na linha da frente outra vez: de Bert Jansch (na foto), do projecto Waterson:Carthy e de Robin Williamson.
BERT JANSCH
«THE BLACK SWAN»
Sanctuary Records
Bert Jansch - ele que foi a força-motriz dos seminais Pentangle - é geralmente mais conhecido e aclamado pelo seu trabalho como guitarrista. E também é justo: considerado muitas vezes como o Jimi Hendrix da guitarra acústica e influência maior de gente tão diferente como Jimmy Page e Mike Oldfield, Neil Young e Johnny Marr, Bernard Butler e Devendra Banhart, Nick Drake e Noel Gallagher, o guitarrista escocês é também, sempre foi, um cantor e um compositor de altíssimo gabarito. E o seu novo álbum, «The Black Swan» - considerado pelo Raízes & Antenas como o melhor da folk britânica de 2006 - é bem a prova de que Jansch continua, ultrapassados os 60 anos de idade, em altíssima forma. Acolitado neste disco por gente como Beth Orton (que canta em dois temas) e Devendra Banhart (em outro), Jansch - voz, guitarra, às vezes banjo e teclas - interpreta de forma soberba vários originais e alguns tradicionais adaptados, sempre com um trabalho de guitarra lindíssimo (falar de filigranas faria algum sentido, mas teriam que ser filigranas «simplificadas», mais um crucifixo bem trabalhado do que uma arrecada minhota), uma voz marcada por muitos anos de bom álcool e um viajar contínuo entre a folk (britânica e norte-americana), os blues e a country. Uma lição de vida e de música - de, se calhar, má-vida e muito-boa-música. (10/10)
WATERSON:CARTHY
«HOLY HEATHENS AND THE OLD GREEN MAN»
Topic Records
Possivelmente só não coloco - de uma forma injusta, irracional e absolutamente não desculpável - o novo álbum do projecto Waterson:Carthy ao mesmo nível do de Bert Jansch porque tenho estado, nos últimos anos, muito mais em contacto com o trabalho deste projecto (e dos seus integrantes) do que do de Jansch. Parece a história do «filho pródigo» - neste caso do «avô pródigo» - e de certa forma é. Dito isto há que dizer agora que o novo álbum do casal Norma Waterson e Martin Carthy, da filha de ambos Eliza Carthy e do fenomenal multi-instrumentista Tim van Eyken, ainda por cima acompanhados em muitas canções pelos Devil's Interval e as suas também maravilhosas vozes voadoras, é um disco fabuloso que nos transporta através de várias épocas e de vários locais das ilhas britânicas, tendo quase sempre como mote canções de Natal - todas tradicionais à excepção de «St John», de John Kirckpatrick, e «Jack Frost», de Mike Waterson -, nunca ortodoxas e algumas delas obviamente mais «pagãs» que religiosas. E o resultado é um belíssimo mostruário alternativo aos «Jingle Bells» e «Little Drummer Boys» desta vida, sempre diferentes - na intenção, nas harmonias, na instrumentação -, sempre um encantamento bom de se ouvir; e deveria ser de audição obrigatória em qualquer casa durante a, digamos, bendita quadra. (9/10)
ROBIN WILLIAMSON
«THE IRON STONE»
ECM
O leitor mais atento reparou, provavelmente, na editora deste disco: a ECM, uma das mais respeitadas editoras de jazz (com muitos desvios lá dentro). E, apesar de sair por uma editora de jazz e ter lá dentro músicos de jazz e alguns ambientes de jazz, este fantástico novo álbum de Robin Williamson nunca deixa de ser folk. E da melhor folk que se ouviu em muitos anos. Oiça-se, só para dar um exemplo, o fabulosa canção «The Yellow Snake», e perceber-se-á imediatamente o que quero dizer. Neste álbum, Williamson (que pertenceu a outra banda seminal, a Incredible String band) recupera muitos temas da sua discografia - entre originais, tradicionais e poemas antigos em músicas novas - e dá-lhes novas e extremamente sedutoras roupagens, com a ajuda de músicos como o veterano baixista norte-americano Barre Phillips, o também norte-americano violinista e violetista Mat Maneri e o multi-instrumentista sueco Ale Moller (conhecido dos Filarfolket e, mais recentemente, Nordan Project). Williamson, ele próprio, canta e toca vários instrumentos, com destaque para a harpa céltica (que nas suas mãos soa muitas vezes a uma kora). E o álbum é, obviamente, mais experimental, livre e aberto do que os outros aqui referidos, mas fica muito bem ao seu lado nesta lista de velha folk que é melhor do que muita da nova que por aí se vai fazendo. (9/10)
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