28 novembro, 2006

Blasted Mechanism - A Saga Continua...


De dois em dois anos, no início do ano. É este o relógio biológico, místico, criativo dos Blasted Mechanism. Sim, vem aí um novo álbum, previsto para os primeiros meses de 2007, do colectivo de Karkov, Ary, Valdjiu, Sync, Zymon e Winga. Enquanto o disco não chega, aqui ficam duas entrevistas com a banda a propósito dos seus dois últimos álbuns, «Namaste» e «Avatara», originalmente publicadas no BLITZ em Fevereiro de 2003 e Março de 2005, respectivamente.


BLASTED MECHANISM
O DIVINO QUE VIVE EM NÓS

Quem são os 22 bebés-diamantes que irão conduzir a Terra a um futuro melhor e mais brilhante? Quem são os músicos africanos que iluminam alguns temas do novo álbum, «Namaste», dos Blasted Mechanism? E o que é que os Blasted têm a ver com a cultura rave? Porque é que parece haver algo de muito importante a acontecer num armazém de uma aldeia chamada Abóboda? E o que é que Bilal e Giger têm a ver com isto tudo?... As respostas seguem já a seguir, nesta entrevista em que respondem Karkov, Valdjiu e Ary e que tem como mote «Namaste» e tudo à sua volta (do Divino ao mais humano).

O que é que significa «Namaste» (NR: leia-se «Namastê»)? Tem alguma coisa a ver com a palavra em sânscrito que significa «o Divino que vive em ti»?

É isso mesmo. E é uma saudação. Para nós, é uma saudação à Humanidade, como se nós nos curvássemos perante a Divindade dos seres humanos. Em 1986 os Blasted criaram um conceito, uma história ficcional, que tem tido desenvolvimentos. Houve uma raça de seres de outro planeta que aportou à Terra. Houve o desenvolver de seres vindos de um ambiente aquático e que povoaram a Terra. Agora, há seres que estão espalhados pelo planeta e que ninguém sabe quem são - os bebés-diamantes - que poderão levar o planeta a uma nova dimensão. Os bebés-diamantes, que têm sido estudados pela cultura nepalesa, são mentes altamente predispostas para fazer a mudança da Humanidade, uma mudança de modo de vida, de mentalidades, de conceitos. Na nossa ficção, os Blasted anunciam a chegada, preparam o terreno, dessas crianças-diamantes... E esta ficção poderá passar para uma narrativa, em banda-desenhada, proximamente.

O novo álbum começa a ter características mais electrónicas a partir do tema 6, até parecendo um velho LP com dois lados. Esse «lado B» - que é mais «Mechanism» apesar de continuar a ser «Blasted» - parece ser a continuação lógica do álbum de remisturas «Mix00» e até de alguns concertos vossos mais recentes. O álbum de remisturas fez mesmo os Blasted repensarem a sua música?

Essa parte dos dois lados está correcta: gostávamos que as pessoas tenham tempo para entrar no ambiente do disco, para fazer uma viagem que tenha um princípio, um meio e um fim coerentes. O álbum de remisturas foi importante porque nos deu a oportunidade de exprimirmos aquilo que queríamos fazer em estúdio, experimentando. As remisturas foram muito feitas por nós próprios, em estúdio, com uma forma diferente da produção clássica; e com algumas pessoas exteriores a ajudar.

Mas os vossos concertos mudaram a partir daí...

O «Mix00» foi um disco de transição porque, finalmente, conseguimos misturar ambientes musicais que já queríamos recriar há muito tempo e que não conseguiam saltar só com o baixo, a bateria, a guitarra, a voz... Mas, mesmo antes de termos feito as remisturas, nós já ouvíamos aqueles ambientes atrás das músicas. Depois, em cima do palco, com a energia rock inerente à banda, conseguimos transformar esses temas em grandes paredes, grandes massas, de som.

Vocês nunca foram apenas um grupo rock - desde o início que há outras músicas na vossa música. Mas em «Namaste» ainda está mais presente o recurso a músicas de diversas proveniências (África ou Índia, por exemplo, mas também a electrónica, o funk, o dub, o ragga...). Os Blasted estão, definitivamente, cada vez mais fartos do rock?

Os Blasted nunca foram rock. Nós acabamos por nos servir do formato rock para dispararmos para todo o lado. Nós temos uma formação rock mas extravasamos para outros lados. O que se mantém rock, neste momento, é mais a energia dos espectáculos ao vivo. E nesse caldeirão rock nós damos um espelho do que é o mundo - mas longe da world music -, do que são outras músicas.

Essa vossa aproximação a sonoridades vindas de várias partes do mundo parte de que tipo de necessidade? Uma necessidade estética - no sentido de precisarem de diversificar a vossa música - ou uma necessidade que tem a ver com a vontade de comunicar algo de diferente: uma mensagem de abertura ou uma postura política e de intervenção?

Tem a ver com a nossa vontade de transmitirmos um conceito, de chegarmos a mais pessoas, de irmos à procura de outras sonoridades. Nós não somos uma banda de intervenção social ou política - se bem que, se tivéssemos gravado o álbum agora e devido à conjuntura mundial, talvez tivéssemos ido mais por aí -, mas temos as nossas convicções e temos temas em que mostramos as nossas ideias. O tema «I Believe» (NR: em que Karkov canta: «I believe in the power of people», etc.) é um manifesto de quem tem necessidade de uma mudança. Aqui, o cantor é um pregador que faz um alerta ao acordar das consciências.

E pode dizer-se que os Blasted, acima de tudo, pretendem fazer uma música tribal, xamânica, de festa e comunhão?

Sim. Nós criamos um cerimonial, uma celebração de festa, de comunhão; que obedece à conjugação de forças que nós extravasamos para a nossa ficção (NR: ver resposta à primeira pergunta). Principalmente ao vivo, pretendemos fazer uma celebração - e desde sempre que se celebram as divindades através da música e da dança - e descobrir a Divindade que existe em nós e em quem assiste aos nossos espectáculos. Às vezes, costumamos fantasiar acerca dessa celebração e imaginamos que as pessoas que estão à nossa frente começam a dançar e a formar padrões de dança, como se fossem espirais ou fractais, surgindo um cone de energia enorme que nos envolve e suga a todos - Comunicação!!!... O público dos Blasted procura mais a felicidade e a harmonia do que algo obscuro e pouco perceptível. E isso vem um bocado da cultura rave e das novas drogas, como o ecstasy. É xamânico, é um cerimonial... Mas nos nossos concertos também há momentos menos agradáveis, que pretendem consciencializar as pessoas de que nem tudo é tão bom assim. Nós encontramo-nos, também, no público. O nosso concerto no último Sudoeste foi de um carinho absoluto: nós gostamos muito de vocês e vocês gostam muito de nós. Houve ali um brilho incrível.

Onde é que foram descobrir os músicos africanos que cantam e tocam em «Taman Taman» e «Bolivian Feel» e, já agora, podem falar também um pouco das outras pessoas que também participam no disco?

Nesses temas quem participa são o Mestre José Brahima Galissa (voz e kora) e o Mestre Kabun (percussões), que vêm do Ballet Nacional da Guiné... O Galissa é musicólogo, é um mestre da cultura mandinga. Neste momento, estão cá músicos e bailarinos fabulosos - mais de trinta - que pertenceram ao Ballet Nacional da Guiné e que agora estão em Portugal a trabalhar nas obras. Estes dois músicos que participaram no nosso disco são músicos excepcionais, pessoas que têm uma maneira muito especial de estar na vida. Temos um grupo de músicos que, aqui, vai às Índias e à música klezmer que é a Bigodes Band, um trio de bombardino, acordeão e clarinete-baixo, em que participa o Luís Bastos, que já tinha colaborado no «Plasma». Aliás, é curioso que antigos membros dos Blasted lançaram também as suas sementes: o Miguel Cardona foi formar os Coldfinger; o Alex partiu para os Terrakota... Tivemos o Virgul, dos Da Weasel, num toast; o Salvatori, no didgeridoo. E tivemos quatro bateristas: o João Lencaster, que foi dos Blasted e que depois partiu mundo fora, e que é um fabuloso baterista, mais jazz e drum'n'bass; o Pantera, dos Montecara, mais dub e reggae; o Pedro Leal, que colabora com o Carlos Zíngaro, e aqui tocou guitarra e um kit de bateria bastante estranho; e o Fred Stone, que nos acompanha ao vivo. Nós tínhamos que diversificar as nuances rítmicas e foi necessário trabalhar com pessoas diferentes. Depois, o trio de produção Toolateman (Valdjiu, Ary e Dominique Borde; com Karkov a fazer o trabalho de «rato de biblioteca» e as letras) tratou isto tudo. Estivemos um ano em estúdio a trabalhar com todas as pessoas e a tratar estas nuances todas. Isto, em termos financeiros, não tem preço.

Já parecem os Pink Floyd, vocês...

Só não estamos é num barco no meio do Tamisa (risos).

E como é que vão ser os novos concertos?

Nós passámos uma fase, os últimos três anos, em que praticamente só trabalhámos nós os três e estivemos sem banda, praticamente sempre a ensaiar e a gravar em estúdio. Agora, o Luís Simões (dos Saturnia) começou a tocar ao vivo connosco, em guitarra eléctrica e sitar eléctrica... Ele fez uma remistura para o «Mix00» e vai também entrar para o núcleo de composição de um próximo disco; e temos desde há algum tempo um baterista brasileiro, o Fred Stone. Nenhum dos temas do novo álbum foi antes tocado ao vivo e estamos a ensaiar intensivamente para passarmos as canções para o formato ao vivo.

Vocês pensam integrar-se, falando de uma forma simplista, nalgum tipo de movimento ou consideram-se um absoluto OVNi no panorama musical?

Os Blasted estão a tentar potenciar o talento de outros artistas, tanto em termos de estúdio como de sala de ensaios (NR: os Blasted transformaram um armazém, na Abóboda, perto de S.Domingos de Rana, em estúdio, sala de ensaios e escritório da sua editora, a Toolateman). Nós, por exemplo, fazemos o «Salvem a Música Portuguesa» à nossa maneira: temos uma editora, a Toolateman, para a qual já gravaram ou vão gravar o Mercado Negro (NR: projecto de Messias, dos Kussondulola), o José Brahima Galissa (NR: guineense, cantor e tocador de kora, que participa em «Namaste»), os Montecara (NR: reggae), os Cartel 70 (NR: ragga/drum'n'bass), os Ylang Top (NR: projecto paralelo de Valdjiu) e, possivelmente, um duo romeno de acordeão e violino. Queremos que as coisas funcionem de igual para igual entre a editora e os músicos. Procuramos novos talentos, pessoas que poderão também vir ou não colaborar com os Blasted; criar, talvez, um pequeno movimento... (NR: para além de alguns destes nomes, pela sala de ensaios passam também, sem ligação à editora, os Toranja ou os Dazkarieh). E a primeira edição da Toolateman é este novo álbum dos Blasted - neste caso muito bem casada com a Metrodiscos e com a EMI, que distribui e promove o disco.

Há alguma possibilidade de o vosso disco ter distribuição internacional?

Temos uma empresa inglesa que está a trabalhar connosco activamente, a Other Kind, que nos levou ao Atlantic Waves. Estivemos na Holanda, no festival Eurosonic, em Londres. E há possibilidades - já com contactos feitos - de o nosso álbum ser editado nos Estados Unidos, Inglaterra, França e Austrália.

Vai haver remisturas de temas do vosso novo álbum?

Vai. Mas neste caso gostávamos de enviar os temas a remisturadores de top: os Thievery Corporation, os Groove Armada, o Lee Perry, o Mad Professor, os Air, os Daft Punk, os Gotan Project, os Sofa Surfers... Se for feito, será um projecto completamente externo a nós. E é uma tentativa de criar uma rede maior, conhecer novas pessoas, abrir novas portas...

Os Blasted sempre se preocuparam com uma série de coisas paralelas à música: a imagem, as luzes, os fatos e por aí fora. Desta vez, os novos fatos parecem saídos do imaginário de HR Giger...

E do Bilal, também. E do George Lucas (NR: leia-se «Guerra das Estrelas»). Nós partilhamos muitos interesses e muita informação entre nós. E é natural que as influências externas de vários tipos de arte possam estar adjacentes ao projecto. Mas isto só existe porque temos uma grande equipa a trabalhar connosco: o Cristóvão Veríssimo, que faz as luzes e que, como trabalhou em teatro, partilha connosco esse lado mais cénico; o Nuno Elias e o Frederico Gouveia, que fizeram e desenharam os fatos e as máscaras; o Dominique Borde - engenheiro-de-som que é nosso sócio na Toolateman e traz um background muito grande de França, tendo trabalhado com o Sakamoto, o Peter Gabriel, o Eric Serra, fez som para o Luc Besson; o Paulo Prazeres, que é o realizador do teledisco, «Are You Ready»; a Desorgan, que está a fazer o nosso site (NR: já acessível em www.blastedmechanism.clix.pt); o Tó Trips (NR: dos Lulu Blind e artista gráfico), que fez a capa e os anúncios; e os outros todos.


BLASTED MECHANISM
AGARRA O RAGGA, GARRA NAS RAGAS

Depois de «Namaste» (ou, em sânscrito, «o Divino que vive em ti»), os Blasted Mechanism dão-nos mais um capítulo da saga que começaram a escrever há alguns anos: «Avatara» (ou, em sânscrito, «o Descendente de Deus incarnado»). Se calhar, não é mesmo por acaso que que o novo álbum da banda está cheio de sitars, unindo raggas jamaicanos às ragas indianas.

Os álbuns conceituais estão fora de moda - é coisa dos anos 60 e 70, pensa-se, dos Beatles de «Sgt. Pepper's...» e das sagas do Rick Wakeman... -, mas, então, se isso é verdade, porque é que há uma banda portuguesa - os Blasted Mechanism - que, desde os primeiros discos, desenvolve sempre o mesmo conceito, disco após disco, espectáculo após espectáculo, como se toda a sua carreira fosse um livro - religioso? místico? new-age? de ficção científica? - e cada etapa mais um capítulo de uma história que parece interminável? E porque é que há cada vez mais tantas músicas na música dos Blasted, do reggae ao rock progressivo, das ragas indianas às novas electrónicas, de percussões africanas ao hip-hop?

Valdjiu e Ary - os dois Blasted que falam nesta entrevista - começam por explicar o que liga, tematicamente, o novo álbum, «Avatara», ao anterior, «Namaste» e em que fase da «grande narrativa» Blasted é que estamos agora. Diz Valdjiu: «"Avatara" é um conceito que transporta, em si, o espírito daquilo que os Blasted sentem em relação à vida e à música. "Avatara" está presente em muitas culturas ancestrais e actuais, inclusive na portuguesa. Significa "Aquele que vem"...». Tem, portanto, algo de messiânico e de sebastiânico, até... «Sim, é o "Encoberto" e é alguém que vem transmitir uma nova consciência cósmica. Chegámos ao "Avatara" através de uma filosofia chamada Eubiose...». Na ficção dos Blasted, «Avatara» surge na sequência lógica da «fase da recolha e da tutoria dos bébés-diamantes (presente em "Namaste"), que vieram para sincronizar o Homem com o mecanismo cósmico». E acrescenta Ary: «Traduzido à letra, "Avatara", é um Messias, mas para nós é mais a ideia da concretização de uma "conspiração", aqui no bom sentido, que tem como objectivo, através do "Avatara", termos todos a consciência global de que temos que mudar a maneira como encaramos o tempo, o calendário, e como mecanizamos a nossa vida ao ponto de perdermos quase completamente o nosso lado espiritual».

Digo-lhes que há poucos dias tinha entrevistado outro artista português, José Castro - a propósito do álbum «Tree of Life» - e que ele tem algumas ideias paralelas aos Blasted: «o Homem precisa de parar para sentir; como as árvores». Os Blasted não conhecem José Castro, mas revêem-se na ideia: «É isso mesmo. A ideia é parar o tempo. A forma de estar mais harmoniosa está presente nas árvores, que comunicam inclusive entre elas... São pontos fixos, de uma grande longevidade, que largam sementes para se espalhar no vento... No "Avatara", agora falando mais da (nossa) ficção, se viemos tutorizar e preparar as crianças-diamante, há que preparar agora o cenário para o "alinhamento": a compreensão de que o tempo tem que deixar de existir. Enquanto o Homem estiver ligado ao calendário pobre que é o gregoriano, há-de estar sempre ligado à robotização, a um mecanismo dependente de terceiros, nunca dele próprio. Como dizia o Agostinho da Silva, o importante não é ter, é ser». E acrescentam que «ser um artista, um músico, é um privilégio que nos permite pensar mais no ser do que no ter. Estamos um pouco à parte, em contra-corrente, a puxar as coisas para o outro lado... E também vemos o resultado disso no público. Há fãs nossos que mudaram de vida, que nos dão conta de que, a partir do concertro X - e apanhando coisas do ar, "I believe", "are you ready?", "children of the re-evolution" - foram investigar o calendário maia, apanharam a onda "namaste", e mudaram a sua forma de viver».

Os Blasted vêem-se, então, como gurus de alguma coisa?... «Não somos nós, porque estas ideias já vêm de trás. A religião que se pratica agora é a religião do consumo, do ter. É curioso porque fomos filmar o nosso teledisco a Marrocos e não fomos lá porque é "giro", mas porque, apesar de tudo, o Islamismo é uma religião que é mais espiritual do que algumas das outras. Eles param cinco vezes ao dia (para rezar). E parar é reflectir, é repor os nossos níveis de bem-estar. Lá, em alguns sítios, eles têm a consciência de "Avatara", de não olhar para o relógio, nem para o ontem nem para o amanhã. O problema da Europa é que não está em 2005, já está em 2006: o espírito das pessoas está num amanhã constante, num objectivo... um crédito no banco, ter mais e mais...». E fala-se de Enki Bilal: «O Bilal (célebre autor de BD) tem um filme, "O Imortal", em que ele vê as pessoas, no futuro, não com um nome e uma nacionalidade mas como números de grandes corporações globais. Imaginemos: o meu bilhete de identidade não é português, é da Sonae...».

Essa transmissão da «mensagem», que já afectou alguns dos fãs dos Blasted, é uma das razões para o grupo ter adoptado, no novo álbum, quase por completo a língua inglesa, em detrimento do dialecto «karkoviano»: «Foi uma necessidade que o Karkov (vocalista e letrista) teve para fazer passar uma mensagem concreta. Essa preocupação já existiu no "Namaste" e é agora ainda mais premente. Assim fica mais fácil a compreensão deste imaginário Blasted. Mas não estamos presos a isso. Se calhar o próximo álbum é todo em karkoviano. Somos "deuses" do nosso próprio universo, por isso podemos criá-lo à nossa medida. E isto só há-de acabar, se calhar, um dia, quando já não tivermos mais nada para dizer. Com um final feliz (risos)».

E enquanto esse final não se vislumbra no horizonte (digamos, temporal), há outras coisas a saber sobre os Blasted. Por exemplo, que «Avatara» é o primeiro álbum do grupo a ter lançamento mundial através da editora alemã A-Label e que, através de um agente europeu, «o novo álbum foi já apresentado em duas cidades da Suiça e duas da Alemanha. Eram públicos que nunca tinham visto Blasted e no início dos espectáculos ficaram um bocado a olhar, mas depois deixaram-se levar. E, digamos assim, aquele gajo que estava lá à frente a tirar-nos a onda toda rapidamente se tornou um aliado de festa. Em Munique foi uma grande festa mesmo». E, dizem, é bom que o «Avatara» possa chegar a muito mais pessoas. Mais a mais porque «finalmente, os Blasted são outra vez uma banda», com a entrada de Luís Simões (dos Saturnia e com o pseudónimo Zymon nos Blasted Mechanism) na sitar e na guitarra eléctrica, ainda na digressão de «Namaste» e entrando para o núcleo de compositores de «Avatara» - «o Luís é uma pessoa única, completamente fora, e é super-perserverante no seu trabalho de músico. E é um grande conhecedor de muita música que os Blasted não conheciam, inclusive de música portuguesa que nós não conhecíamos -- os anos 60, 70, rock progressivo, psicadélico...»; o percussionista Nuno Patrício (Dumdumba, Dazkarieh, Uxu Kalhus...; aka Winga), «pela necessidade de voltar ao tribalismo das peles, ao ritmo, a África... e ele toca imensos instrumentos diferentes, das steel-drums a uma trompa tibetana de seis metros de comprimento»; e o baterista Fred Stone (Sync), que já acompanha a banda há alguns anos.

Os Blasted como «banda» - e também por serem uma «banda» - são, neste álbum, mais orgânicos de que em discos anteriores e - apesar de imensas ramificações musicais presentes no disco - parece, muitas vezes, um encontro de raggas jamaicanos com ragas indianas. «Há um calor vindo de África e das suas ramificações em músicas jamaicanas, americanas, com a sensualidade oriental que não vem só da sitar, vem também das melodias e das harmonias. Há aqui uma mescla de coisas que, no fundo, sempre foram influências dos Blasted e que, agora, ao vivo, têm muito mais potencial. Há muito mais actividade física, ao vivo, paralelamente a cenários e projecções de imagens em que exploramos o nosso universo (conceito presente nos concertos da digressão de apresentação do álbum)».

Em «Avatara» estão presentes vários convidados, entre os quais a cantora Maria João: «ela canta num dialecto africano, mas não a convidámos só por causa dessa ligação a África, foi mais pela liberdade como ela encara a música, pelo experimentalismo, pela improvisação. Ela improvisou, nós não, e isso abre portas que nós nunca abriríamos. Ela é fantástica... é um sintetizador humano, faz sons inimagináveis com a voz». E outros: «o clarinetista Luigi Lust (Luís Bastos), que já colabora connosco há alguns anos - foi ele o grande responsável pela nossa entrada no klezmer...», outro colaborador habitual, Salvatori Tiliba (aka Henrique Figueira; coros; responsável pelo projecto de imagem ao vivo), e duas contribuições de fora da «família»: o grupo hip-hop Dealema «numa música que tinha uma cadência old-school, e os Dealema foram muito rápidos e profissionais, escrevendo uma coisa muito gira - uma espécie de um tributo - e é um choque ouvir o disco, chegar ali e ouvir uns gajos em português»; e o DJ NelAssassin, que «é um mágico dos pratos».

Ainda antes do álbum saiu o DVD dos Blasted, «um documento para os fãs, os coleccionadores. Tem muitos espectáculos, principalmente de 2000 a 2003, tem telediscos, imagens de bastidores... Tem N coisas que, de outra maneira, os fãs teriam que ir roubar a cassetes VHS. Deu uma grande trabalheira mas também deu muito prazer». E, para o futuro próximo, a estrutura editorial dos Blasted, a Toolateman, prevê a edição de álbuns dos Cartel 70 (ragga/drum'n'bass/hip-hop) e do DJ Dimitrivzki (o alter-ego dos Blasted para remisturas), e o apoio editorial a dois projectos guineenses, Tama La e Bela Nafa, e a um outro, euro-africano, Kandoo (projecto paralelo de Valdjiu).

1 comentário:

Anónimo disse...

A special thanks to BM... you change my life!!!!! a shake from the heart!!!! nadabrovitchka!!!!