21 maio, 2007
Breve Crónica do Folk and Roll (ou Quando os Adversários São as Claques)
Os Pé na Terra (foto de Hugo Lima) foram os vencedores do primeiro concurso Folk and Roll, que decorreu ontem à noite no Contagiarte. Justos vencedores, diga-se, em decisão unânime do júri. Assim como unânime foi o segundo prémio, para os Pulga na Palha. Mas, como referiu o organizador e anfitrião Osga, ganharam todas as bandas presentes. Como, aliás, começaram a ganhar logo que todas elas começaram a chegar a este maravilhoso espaço portuense: todos eles se conhecem, todos eles já tocaram alguma vez uns com os outros, há muitos que participam em projectos comuns, ou pelo menos já se cruzaram por aí em andanças e Andanças várias. E, desde a hora de almoço até ao final da noite, bem noite, eram mais os beijinhos e abraços e desejos mútuos de boa sorte do que qualquer indício de competição entre todos eles. Tanto ou tão pouco que - durante o «concurso», aqui já com aspas, porque de concurso já não se tratava - as claques de cada uma das bandas acabaram por ser compostas pelos membros das outras bandas. E, sempre, com um amor enorme entre eles todos.
Derreados de uma viagem complicada e atribulações várias, os lisboetas Tanira abriram, e muito bem, o Folk and Roll com a sua mescla lindíssima de música erudita e popular, renascentista dos salões nobres e das danças do povo, actual porque tão bem integrada no enorme movimento de recuperação das danças tradicionais europeias. A presença da viola de gamba baixo dá um toque único ao som dos Tanira, toque que é, paradoxalmente, complementado por um baixo eléctrico que contribui para a pulsão rock de alguns dos momentos. E, a pairar por cima da base rítmica, há violino, bouzouki e o Gonçalo em gaita-de-foles, viola d'arco e uillean pipe (maravilhosamente bem tocada num tradicional irlandês). A seguir, os Tor, do Fundão, em que pontificam os divertidíssimos gémeos Marco e Bruno (e com a contrabaixista Sara, dos Mu, a estrear-se com eles neste concurso), levaram jigs e reels extraordinariamente bem tocados ao concurso, escola feita no antigo projecto dos dois, os Salamander. Num dos temas, os Tor - nome das formações rochosas da serra da Gardunha - contaram com a colaboração da flautista inglesa Alice. E se a proposta dos Tor não é original é, sem dúvida, de uma paixão e uma alegria raros entre nós. Depois, os portuenses Pé na Terra surpreenderam com uma versão maravilhosa da «Balada do Sino» (tradicional/José Afonso). Surpresas que continuaram quando à música de sabor tradicional português adicionam outros elementos como o reggae, o rock, uma valsinha irresistível, ska e punk (inclusive num tema que vai de Trás-os-Montes aos Pogues num instantinho). Projecto de Cristina (voz e acordeão) e Ricardo (gaitas-de-foles, flauta, gralha, etc...), mas também com a presença fundamental de um guitarrista, um baixista e um percussionista novinho mas seguríssimo (Tiago), os Pé na Terra - que têm pontos de contacto sonoros com Uxu Kalhus - irão, de certeza, muito longe. Logo a seguir, os Pulga na Palha apresentaram a melhor proposta a nível cénico do festival. Liderados por duas raparigas - uma portuguesa, a outra espanhola de ascendência galega -, mas também com dois músicos repescados aos Pé na Terra (o Ricardo e o Tiago), os Pulga na Palha apresentaram-se com roupas bárbaras e uma atitude fortíssima: eles tocam música medieval de várias origens (França, Itália...) com a ajuda de gaitas-de-foles e percussões várias (incluindo as qraqabas da música gnawa e os tambores tradicionais portugueses) e, muitas vezes, o som que fazem é tão selvagem que pode pedir meças aos grupos punk mais pintados. São de uma vivacidade, alegria e verdade incríveis. Finalmente, os Ra.In foram «a carta fora do baralho» disto tudo mas foram também interessantíssimos. Colectivo alargado de músicos e convidados, os Ra.In fazem «chill-out progressivo» mas a designação é redutora para tudo aquilo que, e de muito bom, se passa no palco. No grupo há electrónica e samples (samples de coisas tocadas pelos músicos do grupo) mas também muitos instrumentos acústicos - chegou a haver três guitarras clássicas ao mesmo tempo em palco, para além de djembés, didgeridoo, pau de chuva, crótalos... -, duas vozes femininas (Diana, dos Mu, e a cantora de jazz Ester) e uma música viva que navega pelo trance, o rock progressivo, alusões à world music... É por vezes tribal, outras vezes telúrico, outras vezes ambiental. Acabaram o mini-concerto todos a rir.
O júri - que acabou por ser constituído por Quico (músico, produtor e técnico de som), Rui Oliveira (actor, encenador, director artístico do Contagiarte), Osga (músico e organizador do concerto) e, hummm, António Pires (jornalista) - atribuiu os prémios que já foram referidos no primeiro parágrafo, ficando as outras três bandas, ex-aequo, em terceiro. Ah, e o «misterioso» cabaz do primeiro prémio (para além da abertura do Granitos Folk) era constituído por apetitosíssimos produtos de agricultura biológica, da mesma «mercearia» que também forneceu o lauto jantar que antecedeu o «concurso». Uma garrafa azul que os Pé na Terra também licitaram e uma garrafa de licor misteriosamente aparecida por ali também contribuíram, e de que maneira, para um final de festa - com jams várias - inesquecível.
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4 comentários:
ensaio sobre a partilha e a
expressão viva e praticada no amor à musica, assim se poderia chamar!!
/de sempre o coração na raíz e nas antenas.../
e afinal os mistérios do cabaz
eram ...outros...:)
beijO*
Un-Dress:
:)
Beijo
:((((((((((((
não sei comentar!
leio. re.leio....e apenas tre.leio.
___________________
não vi. não conheço.
tamanha ignorância a minha.
deixo um beijo.
boa tarde Música.
Isabel,
Não é vergonha nenhuma não conhecer estes grupos. São todos bastante recentes (e os que não o são têm-se movimentado num circuito, digamos, restrito: Pulga na Palha em feiras medievais; os Ra.In em festivais de trance...) e daí a sua presença neste concurso, aberto apenas a grupos sem discos editados. Mas se houver justiça todos eles serão, um dia, bastante conhecidos... Beijo de boa noite.
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