20 junho, 2007

«FMI» de José Mário Branco - Em Novas Vozes, 25 Anos Depois



Saquei esta notícia ao Pimenta Negra, um dos meus blogs preferidos, pela liberdade de pensamento que se vive ali, pelos textos magníficos que por lá leio (veja-se o fabuloso texto sobre James Joyce), pela sua coragem interventiva. E mesmo que o Pimenta Negra refira, por sua vez, outra fonte, é justo que esta notícia, pelo menos aqui, lhe seja «creditada». E a notícia é: alguns jovens (ou menos jovens) cantores, músicos, DJs e VJs portugueses - Armando Teixeira, Ana Deus, Kalaf, DJ Nel Assassin, Melo D, Sagas, Spaceboys (na foto), Video Jack e Tiago Santos - comemoram os 25 anos da edição do extraordinário, violentíssimo e importantíssimo «FMI», de José Mário Branco, com um espectáculo no Music Box, ao Cais do Sodré, em Lisboa, dia 28 deste mês. Como mestre de cerimónias da iniciativa (intitulada 25º Aniversário do «FMI» - Give Me Some Money) está o jornalista, DJ, editor e músico Rui Miguel Abreu, autor de um texto que enquadra perfeitamente o que antes se passou e o que agora se vai passar:

«“É o internacionalismo monetário,” explicava José Mário Branco na introdução do mítico “FMI”. Na verdade é muito mais do que isso. É um retrato poético e satírico de um Portugal às voltas com a responsabilidade de ser, enfim, livre. “(…) estas coisas já nem querem dizer nada, não é? Ismos para aqui, ismos para acolá, as palavras é só bolinhas de sabão(…)” Mas de facto as palavras – como “comunismo” e “fascismo” a que aqueles “ismos” se referiam – eram bem mais do que bolinhas de sabão. Eram uma ferramenta num tempo em que o futuro ainda se construía com ideias. E nesse tempo, a música tinha outro valor, outro peso e outra força. José Mário Branco escreveu “FMI” em 1979, quando muitos sentiam já que Portugal e Abril tinham deixado de rimar, de andar lado a lado. Este foi o período em que a chamada música de intervenção se pode estender para lá das metáforas que desafiavam o lápis azul dos censores. Mas as raízes de José Mário Branco estavam no exílio, onde a sua carreira arrancou, ainda durante a década de 60. Ao longo dos anos, José Mário não se limitou a trabalhar nas suas próprias composições e emprestou o seu talento de arranjador a clássicos de José Afonso, por exemplo. O pós-25 de Abril foi período e terreno de utopias: formou o GAC, trabalhou como actor na Comuna, fez bandas sonoras para filmes e, em 1979, foi expulso do PCP. “FMI” é filho directo de todas essas experiências e muito provavelmente o resultado de uma desilusão crescente. Mas, “FMI” só seria editado em 1982, no fomato maxi single que entretanto se tinha tornado na medida certa de uma outra revolução de palavras que do lado de lá do oceano tomava conta de Nova Iorque e se preparava para conquistar o mundo. Esta forma cadenciada de dizer textos – uns mais inflamados do que outros, naturalmente – tinha raízes fortes nas Américas (Gil Scott-Heron, Isaac Hayes e até Pete Seeger), mas também na França onde José Mário recolheu o seu próprio universo de referências (Leo Ferre…). No ano em que “FMI” foi editado, Portugal andava às voltas com o boom do rock português: os Xutos editavam o clássico “1978-1982” onde um eléctrico “Avé Maria” atentava à moral e aos bons e velhos costumes; os GNR espalhavam as suas “Avarias” pelo segundo lado inteiro de “Independança”; e Portugal, enfim, lá ia inventando a sua própria modernidade, com direito à segunda edição de Vilar de Mouros em Agosto de 82 e tudo. E José Mário Branco? Editava “FMI”, uma espécie de “vómito emotivo” como lhe chamou Nuno Pacheco em 96. Um jorro de emoções que vão da raiva ao lamento, do grito ao sussurro enquanto se pinta um Portugal perdido, às voltas sobre a sua memória e sobre os novos caminhos que se abrem à sua frente. José Mário Branco é mordaz, violento, certeiro nas suas observações, com acompanhamento simples de viola acústica ou flauta para não distrair ninguém do verdadeiro centro desta peça – as palavras. Curiosamente, na sua edição, José Mário Branco proibia a execução pública e radiodifusão deste trabalho, talvez por causa do conteúdo severo das palavras, talvez por achar que a catarse em que tinha investido só podia ser experimentada por uma pessoa de cada vez. 25 anos depois, o mito cresceu, e essas palavras continuam a fazer pleno sentido. Entretanto, uma nova geração de autores, filhos da liberdade de 74, mas também das ideias exportadas do Bronx, também mexe nas palavras para descrever a realidade que nos rodeia a todos. E tal como no “FMI” de 82, também o que se cospe em 2007 não é bonito».

Para saber mais pormenores sobre o 25º Aniversário do «FMI» - Give Me Some Money pode ir ao myspace da iniciativa. Para ouvir e ler o texto completo de «FMI», de José Mário Branco, aconselha-se a visita a este site.

20 comentários:

isabel mendes ferreira disse...

este deve ser o blog onde me sinto mais "ignorante"


mas insisto...


um dia ainda me arrisco a "virar" culta.musicalmente...


beijo Música.

ANJOS PRADA disse...

Olá António! Como sempre é um prazer visitar o seu Blogue. Dá-nos as informações detalhadas sobre o que está acontecer no campo musical! Muito Obrigada :))

António Pires disse...

Isabel:

Ignorantes somos todos perante a imensidão da(s) música(s). Mas não acredito que não conheça o «FMI». Se for esse o caso, oiça-o (ou leia-o) por favor no site referido. É poesia pura e dura, que fala do mundo, do país e da pessoa que o escreveu como poucos poemas o fizeram em Portugal. E é, ainda, de uma actualidade chocante, se se trocarem coisas óbvias (leia-se G8 em vez de FMI), leia-se «Floribela» em vez de «O Astro», leia-se os políticos todos actuais em vez dos políticos da altura, etc, etc...

Entretanto, o José Mário Branco estreou recentemente no Porto um espectáculo na linha do «FMI» chamado «Mudar de Vida». Ainda não consegui vê-lo, mas não faltará muito...

Beijo Poesia


Prada:

De nada! É o meu prazer...

António Pires disse...

Isabel:

Só uma nota: a transcrição das palavras do «FMI» no referido site tem algumas gralhas (por exemplo: «Muchê Dyane» em vez de «Moshe Dayan», «destabilização» em vez de «desestabilização», «Marraças» em vez de «Marrazes», «anti-faxistas» em vez de «anti-fascistas», etc.), mas de certeza que quem a fez a fez com amor... Dê esse desconto.

un dress disse...

mais uma inculta antónio...!

mas sem culpa...:)


que alguma coisa vai ficando!!



beijO

António Pires disse...

Un-Dress:

Ficando é uma palavra tão bonita!! Porque tem dentro, oculta, uma contradição: «fico» ou «ando»?...

Beijo (e obrigado, claro)

ANNA-LYS disse...

Hello António,

Today we have almost 24 hours daylight :-D
We Swedes needs that. Hope everything is fine with You!

Happy Midsummer!

(( Bjs ))

isabel mendes ferreira disse...

vou hoje ver/ouvir?!

obrigada António.


depois darei notas msicais sobre...:))))

_____________beijo....a aprender...


sorriso.

Música.

isabel mendes ferreira disse...

pois vim de lá....






__________________


maravilhada!

por um texto que gostaria de ter escrito!!!!!!!!!!!!!!!!!


obrigada António.



beijo.

António Pires disse...

Anna-Lys:

:)))

Happy Midsummer and enjoy all the Aurora Borea-Lys ;) you deserve!!!

((hugs))


Isabel:

A versão gravada do «FMI» aparece na íntegra, como bónus, na edição em CD do álbum «Ser Solidário». Ainda me arrepio (e comovo e revolto e choro...) quando a oiço.

Beijo Poesia

Bandida disse...

antónio, que boa surpresa esta! tenho em vinil o FMI. ando há séculos a tentar encontrar uma edição em cd.

é, efectivamente, de uma actualidade imensa. e, sim, faz com que as lágrimas se soltem e os pêlos se arrepiem. continuadamente.

bravo José Mário Branco!

bravo tu, antónio, por falares assim da música e das palavras.


beijo

B.
____________________________

António Pires disse...

Bandida:

Acho que ainda consegues encontrar nalgumas lojas o CD-duplo «Ser Solidário», do José Mário Branco, que foi editado em 1996 pela EMI-Valentim de Carvalho. O «FMI» é a última faixa do CD 2.

Obrigado pelas tuas palavras, sempre!

Beijo B.

A.

Bandida disse...

antónio, tenho o cd do Ser Solidário sem o FMI. já tentei encontrar em tudo quanto é sítio.


obrigada.


beijo

B.
_____________________________-

Ana Jerónimo disse...

A primeira coisa que me veio à cabeça quando li o título deste post foi: ora aqui está uma boa notícia. Passados instantes, a minha certeza de a notícia ser boa fica coxa, e o que a mete a coxear é a realidade nacional; isto na medida em que "FMI" não deveria fazer o avassalador sentido que faz actualmente. Mas, entre o dever ser e o ser pavoneia-se uma distância, que não vale a pena adornar mais. Portanto, claro que a informação é uma boa nova, não só porque homenageia uma obra maior, mas também porque se propõe alertar precisamente para essa distância. Como sou verde ainda, não me alongo mais para não dizer disparates, que o assunto não merece. Pena tenho de não poder assistir ao espectáculo no Music Box. De qualquer maneira, daqui vou arrepiar-me e reavivar José Mário Branco.

António Pires disse...

Bandida:

No site da FNAC (http://www.fnac.pt/) há a indicação de que existe em stock o «Ser Solidário» (e é, provavelmente, o que tem o «FMI» como bónus). Ligue para lá e pergunte ou vá a uma loja e peça para eles procurarem na sua base de dados (se não tiverem na loja podem pedir a uma outra loja FNAC que o tenha).

Beijo


Maria Madrugada:

Pois está coxa. De uma «coxice» que não há meio de nos largar! E é por isso que o «FMI» continua, infelizmente, a fazer tanto sentido. Infelizmente, claro, não pela obra em si - que é genial e eterna - mas por tudo o que ainda nos rodeia. Obrigado pelo seu comentário, tão importante!

Anónimo disse...

Nesta minha primeira intervenção neste blog quero saudar o seu autor pela qualidade e completa informação que ele exibe. A visita é sempre útil e proveitosa. Entretanto, a propósito desta revisistação da obra de José Mário Branco, e para bem da verdade, aqui deixo um comentário que acabo de enviar para o myspace da iniciativa a propósito de uma afirmação que é feita no texto de Rui Miguel Abreu que aqui é reproduzida, e que é, de todo, errada. Para que a velha fase - "uma mentira tantas vezes repetida torna-se verdade" - desta vez não se confirme.

"Bom dia.
Quero, em primeiro lugar, saudar esta iniciativa. É muito importante que a obra de autores marcantes, como José Mário Branco, seja assim revisitada e reinterpretada por novos e jovens criadores, em função, também de novas linguagens musicais. Para além da simples consideração estética, isso contribui para vivificar as palavras e ideias, o que, no caso da obra de José Mário Branco, como de outros autores portuugueses, não é de menor importância. Seria aliás útil e importante que iniciativas como esta fossem prolongadas e alargadas a outros autores, alguns hoje injustamente esquecidos, que marcaram de forma indelével a música e a cultura portuguesa.
Entretanto, seria lastimável se uma iniciaitiva com os méritos que esta exibe ficasse associada a uma informação errada, algo que acontecerá a menos que os seus autores façam a correcção que os factos impõe.
Assim, no texto de apresentação desta iniciativa, assinado por Rui Miguel Abreu, refere-se a dada altura que José Maria Branco «foi expulso do PCP em 1979».
Não posso deixar de chamar a vossa atenção para que se trata de uma referência clamorosamente errada e falsa que deve ser prontamente corrigida.
De facto, impõe-se-me o dever de esclarecer :
1. Jamais em tempo algum, depois do 25 de Abril, alguém atribuiu a José Mário Branco uma filiação no PCP ou sequer qualquer proximidade política que se revelasse pela sua (inexistente) participação artística em iniciativas do
PCP.
2. Não estando em condições de, a esta distância temporal, reconstituir com fidelidade e rigor as siglas identificadoras das organizações políticas em que José Mário Branco participou, e admitindo que JMB poderá ter sido membro do PCP na 1ª metade dos anos 60, a verdade é que, já uns anos antes do 25 de Abril, José Mário Branco estava ligado em França a organizações usualmente designadas como de extrema-esquerda.
3. A ter sido expulso, em 1979, de alguma organização política, facto que não pude verificar, essa não foi certamente o Partido Comunista Português.
4. Estou certo que o autor do texto não deverá ter qualquer dificuldade em confirmar, junto de J. M. Branco, a falsidade da referência em causa.

Com cordiais saudações e votos de sucesso na iniciativa,
CD

António Pires disse...

CD:

Muito obrigado pelo seu reparo e também, claro, pelas simpáticas palavras sobre este blog. E tem razão, o José Mário Branco não foi expulso do PCP mas sim do PCP(R), Partido Comunista Português (Reconstruído). Tenho a certeza que se tratou de uma gralha e não de uma falha do Rui Miguel Abreu, que é sempre bastante rigoroso nos seus textos.

Volte sempre.

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

Alguém sabe o porquê de Marrazes na letra FMI? apenas pelo clube?

bom trabalho!

António Pires disse...

Caro Anónimo:

Sim, acho que é apenas por isso. Mas se alguém tiver outra explicação, é bem-vinda. Obrigado!