27 agosto, 2006

Cacharolete de Discos (Parte 425)


E mais uma colecção de críticas de discos, dispersas, a álbuns de Keziah Jones, dos Urban Trad, de Youssou N'Dour (na foto) e de Tito Puente. Para conhecer...


KEZIAH JONES
«BLACK ORPHEUS»
Delabel/EMI-VC

Pensa-se num cantor e guitarrista e compositor oriundo de Lagos, na Nigéria, e é em Fela Kuti que se pensa logo. Mas depois sabe-se que é de Keziah Jones que se fala e o caso muda de figura: Keziah (Olufemi Sanyaolu de verdadeiro nome) deixou a Nigéria quando tinha oito anos e foi viver para Londres, onde fez a sua formação com toda a música negra... feita fora de África. E mais tarde é acolhido em Paris, na editora Delabel, o espaço perfeito para mostrar a sua música - uma mistura viva e pulsante de música africana de variadas proveniências, afro-beat, funk, soul, jazz, blues, bossa-nova, tudo apimentado por letras que misturam o inglês com o yoruba. Keziah chamou-lhe blufunk, mas podia ter-lhe chamado afrosoul ou yorusurrealism, que seria a mesma coisa. Em «Black Orpheus», o seu quarto álbum, Keziah Jones transporta as suas influências a um estado de depuração máxima. Quando se ouve o álbum ouvem-se ecos de Fela Kuti (até na apropriação de um termo por este inventado, «kpafuca»), sim, mas também de Manu Dibango e Salif Keita, de Jimi Hendrix e de Frank Zappa, de Sly & The Family Stone e de Stevie Wonder (da primeira metade dos anos 70), de João Gilberto e de Prince e de Miles Davis. Mas tudo embrulhado numa música nova, excitante, personalizada - e a letra do tema «72 Kilos», em que Keziah (explícita ou implicitamente) assume todas as influências, explica bem o que por aqui se passa. O último tema, «Orin O'Lomi», só com voz, guitarra e som de chuva, é um lindíssimo espaço de paz (antes de revelar, minutos depois, uma faixa escondida que parece um «rewind» até aos cantos dos escravos levados de África...). (7/10)

URBAN TRAD
«ELEM»
Mercury/Universal

Oriundos da Bélgica, os Urban Trad fazem uma curiosa mistura de folk europeia – da escola «céltica» irlandesa, escocesa e especialmente da nossa irmã Galiza – com rock e electrónicas, notando-se a influência do «efeito» Hedningarna em linguagens folk aqui mais a sul. Resulta muitas vezes bem e de uma forma extremamente interessante - com as programações e os sintetizadores a não encharcarem em demasia os instrumentos tradicionais (gaitas-de-foles, flautas irlandesas, concertina, violino…). Mas também há aqui alguns temas escusadamente ligeiros (um segundo lugar dos Urban Trad num Festival da Eurovisão deixou marcas!) que desequilibram a coisa, outras vezes, para um lado mais pop e «festivaleiro». Um melhor equilíbrio entre os vários elementos constituintes do som Urban Trad não lhes fazia mal nenhum. (6/10)


YOUSSOU N’DOUR
«HEY YOU! – THE ESSENTIAL COLLECTION»
Nascente/Megamúsica

Recordação do astro senegalês nos anos da discórdia.

Youssou N’Dour não é uma personagem consensual. Como se refere – com uma honestidade de assinalar – no livreto deste álbum, muita gente considera-o demasiado africano para atingir o mainstream da pop ocidental, outros acham-no demasiado pop para ser um verdadeiro músico africano. E esta condição dúbia está especialmente patente em «Hey You!», que reúne temas dos álbuns «The Lion» e «Set» (ambos da viragem dos anos 80 para os 90), que lançaram definitivamente o inventor do mbalax no circuito internacional e lhe valeram temas de sucesso como «The Lion», «Shakin' The Tree» ou «Medina». Eu gosto; os outros que decidam também por si. (7/10)

TITO PUENTE
«THE ROUGH GUIDE TO...»
World Music Network/Megamúsica

Tito Puente foi um dos maiores músicos do Séc. XX. Percussionista, compositor, arranjador, chefe de orquestra, «compagnon de route» de alguns dos nomes maiores do jazz nova-iorquino (ele que era nova-iorquino de ascendência porto-riquenha), Tito Puente passou dezenas de anos da sua vida com uma missão: dar dignidade aos géneros musicais latino-americanos, mostrando – através das suas orquestrações que misturavam, em boa dose, poderosas secções de metais e muitas percussões (com um violino aqui e ali; com vozes algumas vezes – e neste disco estão as de La Lupe, Célia Cruz, Vicentico Valdes...) – que se pode dançar com muitas e desvairadas músicas. Neste álbum ouvem-se mambos, salsas, bossa-nova («Meditação», de Tom Jobim), boogaloos... e latin-jazz e funk de vez em quando. E os pés saltam, saltam sempre. (8/10)

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