06 setembro, 2006

Cacharolete de Discos (Parte 741)


Mais uma selecção aleatória de críticas de discos publicadas há alguns meses no BLITZ: de Thione Seck, de Souad Massi (na foto) e dos Sierra Maestra. O de Sinéad O'Connor é mais antigo mas é o álbum mais interessante da cantora nos últimos muitos anos, daí a sua inclusão no lote...


THIONE SECK
«ORIENTISSIME»
Syllart/PIAS/Megamúsica

Cantor senegalês encontra os sons do Oriente.

Na chamada world music há cada vez mais exemplos de fusões aparentemente disparatadas mas que acabam, umas vezes melhor outras pior, por fazer sentido ou, pelo menos, soar bem. Os Ska Cubano misturam ska com géneros cubanos, os MacUmba mesclam samba e gaitas-de-foles escocesas, os Salsa Celtica nem é preciso explicar. Em «Orientissime», o respeitado cantor senegalês Thione Seck (que fez parte da Orchestra Baobab) propõe-se descobrir, ou inventar, alguns elos perdidos entre a música negra africana e músicas «orientais». E sai-se a contento da tarefa quando funde o mbalax senegalês com a música árabe – já não há grandes dúvidas que a música da zona mandinga e dos vizinhos do norte de África tem ligações ancestrais de troca e contaminação. Mas é, apenas, curioso quando se atira à música do Paquistão e da Índia (mesmo que as tablas e as sitars soem muito bem em diálogo com a voz de Seck e coros femininos). (6/10)


SOUAD MASSI
«MESK ELIL»
Wrasse/Harmonia Mundi

E ao terceiro álbum, a cantora argelina Souad Massi dá um passo gigantesco em direcção ao restrito clube das grandes divas da chamada world music. Ainda não está lá completamente, mas a cantora, guitarrista e compositora já está lá muito perto com o seu novo álbum «Mesk Elil». Com uma voz cada vez mais personalizada (quente, maleável, cheia de espírito...), Souad faz agora uma música que tanto vai às raízes do rai como continua o seu gosto particular pelo flamenco ou se atira a outras paragens: a música árabe-andaluza, a música negra sub-sahariana (não se estranhando a presença de músicos que costumam acompanhar Salif Keita ou um dueto com o mauritano-maliano Daby Touré, a música dos tuaregues ou uma colaboração com Pascal Danae, de Guadalupe). Muito bom! (8/10)


SIERRA MAESTRA
«SON: SOUL OF A NATION»
World Music Network/Megamúsica

Clássicos do son cubano revistos com rigor.

Os Sierra Maestra – grupo cubano que nos anos 70 revivificou o son, género maior da música da ilha (se descontarmos a bem mais moderna salsa), nascido do cruzamento de guajiras, changuis e guarachas – fazem neste seu último álbum uma homenagem sentida aos grandes autores e aos grandes temas do son das primeiras décadas do séc. XX. Clássicos de compositores como Ignacio Piñeiro, Arsénio Rodriguez, Ñico Saquito ou Beny Moré são aqui interpretados com amor e um respeito imenso. Por isso mesmo, não se ouvem os nove Sierra Maestra em todos os temas. Ganha-se em rigor, perde-se em chavascal. (7/10)


SINÉAD O'CONNOR
«SHE WHO DWELLS...»
Vanguard

O nome completo do álbum é compridíssimo («She Who Dwells in the Secret Place of the Most High Shall Abide Under the Shadow of the Almighty») e o disco também: apresentado como o último álbum (mesmo o último!) de Sinéad O'Connor, o duplo-CD contém cerca de duas horas e meia de música, dividida num primeiro CD com raridades, lados B, versões variadas, alguns inéditos, num total de 19 temas (!) e um segundo CD com a gravação de um concerto na sua terra-natal, Dublin, o ano passado. E, espantemo-nos, apesar da variedade de estilos e registos presentes nos dois CDs, «She Who Dwells...» é um álbum coeso, maduro, um fabuloso «testamento» da cantora irlandesa.

Quase sempre mal-amada e incompreendida - relembre-se a carequice, o apoio ao IRA, o rasgar da foto de João Paulo II, a bissexualidade, o auto-sagrar-se padre... -, Sinéad dá aqui uma chapada (com as duas mãos e com aquela voz imensa que Deus lhe deu) aos seus detractores, provando mais uma vez que tem uma das melhores vozes da pop e do rock dos últimos 15 anos.

No CD 1, o destaque vai para as versões - mais ainda que para os originais -, com Sinéad a tornar decentes canções péssimas na sua origem como «Chiquitita» (dos Abba!) ou «Love Hurts» (alguém se lembra dos Nazareth a cantar isto?!), a dar «luta», e à altura, à versão de Aretha Franklin de «Do Right Woman», a iluminar «Ain't It A Shame», dos B-52's, e a cantar divinalmente tradicionais irlandeses... Ainda no CD1, há presenças marcantes (Asian Dub Foundation, Robert del Naja, Adrian Sherwood..).

No CD2, o encanto continua: tradicionais irlandeses (sacados ao álbum anterior, «Sean-Nós Nua»), ainda, e algumas interpretações soberbas de «canções de sempre» de Sinéad, como a sua versão de «Nothing Compares 2 U» (de Prince), «Fire on Babylon» ou «I Am Stretched on Your Grave»... Brilhante. (8/10)

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