21 setembro, 2006

Sétima Legião - Aos Amigos...


Os Sétima Legião foram o melhor exemplo nacional de que se pode fazer uma música viva, pulsante, actual, ao mesmo tempo popular e elitista (entendendo-se aqui a expressão, sem preconceitos, como sinónimo de «destinada a um público mais exigente e esclarecido»). E foram-no desde o início. A primeira vez que os vi (finais de 1983? início de 1984?) foi na então ESBAL, no Chiado, com uma violoncelista entretanto desaparecida e já com Paulo Marinho numas gaitas-de-foles que davam ao rock, àquele rock, a raiz de que todas as antenas precisam. A última, mais de vinte anos depois, foi no Frágil, em mais uma das suas raras e quase secretas aparições que fazem a banda continuar viva e a prometer algo para algum dia (assim como ninguém estava à espera do álbum «Sexto Sentido», há alguns anos, talvez um dia destes apareça um novo álbum deles, músicos amigos para além da música, pessoas extraordinárias para além de músicos e amigos)... Aqui, em homenagem aos músicos - e aos amigos, então já nos Sétima Legião ou chegados ao grupo depois... - fica um texto de memória do álbum «A Um Deus Desconhecido», publicado no BLITZ em Novembro de 2002, por alturas de uma escolha colectiva da redacção dos melhores álbuns de sempre da música portuguesa...


SÉTIMA LEGIÃO
«A UM DEUS DESCONHECIDO»
(LP Fundação Atlântica 1984)

Naquela altura, início dos anos 80, estávamos a viver o chamado «boom do rock português». Que de rock - pela incipiência e mediocridade da maior parte dos projectos - tinha pouco e de português - pela injecção de um qualquer espírito local - ainda tinha menos ou quase nada. Mas havia excepções. Havia na altura bons grupos rock, só rock!, fosse ele que rock fosse: GNR, Xutos & Pontapés, UHF, Rui Veloso, Street Kids... E havia grupos, e artistas, que do rock partiam para uma qualquer ideia de portugalidade e/ou de tradição: Heróis do Mar, António Variações, Ocaso Épico... E havia outras aproximações, de outras áreas: os Banda do Casaco vão, nessa altura, e muito bem, ao rock. Os Trovante estão em alta. Fausto assina, em 1982, um álbum magnífico chamado «Por Este Rio Acima», com uma energia que, se não é rock, está lá muito perto.

No início dos anos 80, um grupo de miúdos lisboetas - fascinado pelos sons vindos de Manchester, mas também pela música tradicional portuguesa - pega em guitarra eléctrica, baixo, bateria, mas também gaita-de-foles, para fazer uma música que viria a ficar cristalizada, no seu estado mais puro, no álbum «A Um Deus Desconhecido», editado em 1984 pela independente Fundação Atlântica e produzido por Ricardo Camacho (que viria, depois, a fazer parte do grupo). Neste disco, os Sétima Legião começam em rock - «Com o Vento», obviamente devedor de uns Joy Division ou, até, de uns Big Country - e terminam com um piano - «Anos Depois» - entre John Cale e Brian Eno, como um fio de água que corre. E pelo meio fica um desfilar interminável de visão e ousadia, ao misturar no mesmo prato ambientes que vêm dos Joy Division, sim, mas também de Virginia Astley e dos Durutti Column, dos Sound e dos Young Marble Giants/Gist, com uma alma obviamente portuguesa. O instrumental «Mar d'Outubro» é um fado, sem o ser, com guitarra acústica e sons que imitam gaivotas; «Ritual» tem ritmos, e gaita-de-foles, que vêm da tradição mirandesa; «Pois Que Deus Assim o Quis» é uma marcha processional entre Trás-os-Montes e a Galiza. Surpresas. Encantamento.

A escola Sétima Legião continua: depois de «A Um Deus Desconhecido» outros álbuns vieram, os seus músicos - dessa altura ou entrados posteriormente - passaram (ou passam) pelos Madredeus, Golpe de Estado, Gaiteiros de Lisboa, os projectos a solo de Rodrigo Leão e Gabriel Gomes. Um mundo.

1 comentário:

Anónimo disse...

7ª Legião foi, para mim, a melhor banda portuguesa de sempre... pois criaram composições que melhor caracterizam o ser portugues.

É pena ter ficado, aparentemente, descontinuada, devido às carreiras profissionais de cada um dos elementos.

É uma honra Portugal ter tido um grupo deste nível...

Parabéns aos membros!!!