28 janeiro, 2007

Amsterdam Klezmer Band, Kleztory e Klezmofobia - A Descendência dos Klezmatics


O klezmer, música nascida nas comunidades judaicas do centro e norte europeu, tem nos Klezmatics - que tocaram há poucos dias na Culturgest (ver reportagem no Crónicas da Terra) - o seu expoente maior. A sua fusão de klezmer tradicional com muitas outras músicas deu ao género uma visibilidade enorme junto de inúmeros públicos até aí pouco familiarizados com esta música («Hei, parece que já ouvi algo parecido num filme do Woody Allen...»). E a marca do grupo nova-iorquino sente-se bem em grupos mais recentes de diversas proveniências: a Amsterdam Klezmer Band (na foto) da Holanda, os Kleztory do Canadá e os Klezmofobia da Dinamarca.


AMSTERDAM KLEZMER BAND
«SON»
Connecting Cultures Records

O quinto álbum da Amsterdam Klezmer Band, «Son» (nada a ver com o estilo cubano do mesmo nome: «son» significa «sonho» em russo e foi a essa palavra que a AKB foi buscar o título deste disco) é um belíssimo exemplo de como se pode partir do klezmer para ir para muitos locais. Na AKB, o klezmer - que na sua génese foi influenciado directamente por muitas músicas balcânicas - parte muitas vezes rumo à música cigana do norte da Europa, amiúde com desvios para improvisações jazzísticas muito bem metidas lá pelo meio, quase sempre com um acordeão a servir de base aos delírios da secção de sopros. Neste álbum há alguns temas cantados pelo percussionista e vocalista Alec Kopyt, numa voz rouca e dificilmente olvidável; há uma beleza imensa em «Blue Hora» (que está entre o tango, os blues e o klezmer); há uma velocidade punk vertiginosa em «Bublitzky». E há sempre uma grande variedade estilística e um domínio dos instrumentos invulgar: a AKB é umas vezes de uma alegria insana, outras de um lirismo encantador, outras vezes de uma tristeza e melancolia arrepiantes (como no tema final, «Trieste Dromen»). A banda foi fundada em 1996 pelo saxofonista Job Chajes, vocacionada para actuações de rua, e para os seus membros o klezmer é só mesmo um pretexto para fazer a sua própria música. Bom pretexto. Excelente música. (8/10)


KLEZTORY
«MUSIQUE KLEZMER»
Chandos

Ao contrário da Amsterdam Klezmer Band, os Kleztory estão muito perto da tradição klezmer mas nem por isso deixam de avançar em direcções próprias e originais. Nascidos no Canadá mas com músicos provenientes de vários locais do mundo - Rússia, Canadá (tanto de expressão inglesa como francesa) e França - e muitos deles com formação clássica, os Kleztory interpretam com virtuosismo, respeito e muito amor temas tradicionais klezmer. Neles, a guitarra, contrabaixo, acordeão, percussões e principalmente o clarinete e o violino juntam-se para momentos ora de festa e dança imparáveis, ora para temas onde a nostalgia e a tristeza estão marcadas a fogo e a sangue. E se as bases da música klezmer - a música hasídica da Ucrânia, a música cigana dos Balcãs, a música turca... (isto é, dos locais de passagem da diáspora dos judeus) - estão sempre bem presentes na música dos Kleztory, isso não os impede de por vezes meterem lá pelo meio uns pozinhos de música erudita, de blues ou de country, transformando levemente os originais na busca de uma identidade própria. Vivamente aconselhável, por exemplo, para os fãs dos Muzsikás, principalmente do seu álbum «The Lost Jewish Music of Transylvania». (7/10)


KLEZMOFOBIA
«TANTZ!»
Tiger Records

E com os dinamarqueses Klezmofobia voltamos ao território do klezmer tal como revisto pelos Klezmatics: não por acaso, dois dos temas do álbum «Tantz!» (que significa «Dança!») são tradicionais klezmer mas com os Klezmofobia a seguir os arranjos que para eles fizeram os Klezmatics. E não por acaso, na música dos Klezmofobia - viva, delirante, inventiva, de uma surpresa constante - entram o klezmer, claro, mas também o ska, a música balcânica, o punk, o surf-rock, mariachis mexicanos, tudo junto num cocktail que deve ser bebido... em momentos de depressão: de certeza que quem o fizer fica imediatamente melhor e pronto para deitar para trás das costas qualquer infelicidade próxima ou passada. Armados de uma balalaika-baixo, clarinete, trompete, guitarra, acordeão e bateria, os Klezmofobia interpretam com uma imensa e exuberante liberdade temas tradicionais klezmer, temas da compositora judia dinamarquesa Channe Nussbaum (que canta em dois temas do álbum) e alguns originais. Em «A Terk in America», um tradicional, uma guitarra eléctrica em distorção rock abre caminho a um comovente solo de clarinete klezmer purinho... e muito raramente dois espectros musicais tão diferentes conseguem soar tão bem em conjunto. (8/10)

2 comentários:

Anónimo disse...

Boa tarde camarada,

obrigado pela referência. Sempre chegaste a ir à ZDB no sábado? o gajo que toca clarinete tem muito klezmer nas veias.

Tens o disco de remisturas da Amsterdam KB? Tem lá versões fantásticas, sobretudo a primeira remisturada pelo Shantel. E o Wonder Wheel dos Klezmatics também tem lá temas muito bons, sobretudo o tema-título e o Mermaid Avenue (a fazer lembrar o Billy Bragg + Wilco)

abraços

António Pires disse...

Olá camarada!

De nada! Sim, fui ver a Kumpa'nia Al-gazarra no sábado e foi uma festa pegada (acabou com uma muito boa versão do «Kalasnjikov»!). A ZDB cheia mas menos calor do que no passado (já devem ter ar condicionado) e agora até há uma janela engraçada entre o pátio interior e a sala...

Não, ainda não tenho o disco de remisturas da AKB nem o último dos Klezmatics... Mas hei-de ter :-)

Abraços